Desde 1999 o IBOPE e a
Confederação Nacional de Indústria (CNI) realizam algumas vezes ao ano uma
pesquisa de avaliação do governo e do presidente, bem como de algumas políticas
públicas específicas, como segurança pública, saúde, controle da inflação e
outras.
A série histórica da segurança
pública começa em 2003, primeiro ano da gestão Lula, com 41,3% de aprovação,
ainda sob o impacto do otimismo das eleições.
Mantem-se na faixa dos 30% por três anos e volta a subir ligeiramente em
2007 (43%) com o início da nova gestão e o lançamento do Pronasci. O ápice da série de aprovação da segurança ocorre
por volta de 2010, quando Lula, com elevada popularidade, elege Dilma para a
presidência (43,5%). De 2010 em diante, vemos um processo contínuo de queda na
aprovação da segurança, apesar do lançamento em 2012 do plano Brasil Mais
Seguro, ignorado pela população. A eleição de Dilma em 2014 não gerou entusiasmo
suficiente para deter a queda do indicador. Apesar da leve recuperação em 2016,
ano do impeachment de Dilma, a aprovação das políticas de segurança pública
colocadas em prática pelo governo federal atinge o seu ponto mais baixo agora
em 2018, no final do governo Temer.
Tendo em vista estas flutuações,
cabe nos perguntar o que as explicam e o que de fato se mede quando se pergunta
à população se aprova ou reprova a gestão da segurança. A tabela e o gráfico
abaixo trazem também as séries históricas de aprovação geral do presidente,
avaliação e confiança no governo.
A primeira constatação é que a
aprovação da segurança parece variar em conjunto com a aprovação geral do
governo: se a popularidade do governo e do presidente é alta a segurança é
aprovada e caso contrário é reprovada. Assim, o indicador é antes uma medida
projetiva da popularidade geral do governo do que uma medida precisa da
política de segurança. Uma evidência disso é a coincidência dos picos de
aprovação nos anos seguintes às eleições presidenciais.
Data
|
APROVAÇÃO
DO GOVERNO - APROVA
|
AVALIAÇÃO
DO GOVERNO - ÓTIMO OU BOM
|
CONFIANÇA
NO GOVERNO - CONFIA
|
SEGURANÇA
PÚBLICA - APROVA
|
1999
|
28,4
|
18,0
|
32,2
|
|
2000
|
33,5
|
21,3
|
34,5
|
|
2001
|
34,5
|
22,0
|
33,5
|
|
2002
|
38,5
|
26,8
|
35,5
|
|
2003
|
70,0
|
44,5
|
73,8
|
41,3
|
2004
|
55,5
|
35,5
|
58,8
|
32,0
|
2005
|
50,0
|
33,0
|
50,8
|
30,0
|
2006
|
62,0
|
47,0
|
58,8
|
30,7
|
2007
|
64,8
|
49,5
|
60,8
|
33,8
|
2008
|
77,3
|
64,5
|
72,3
|
43,0
|
2009
|
80,5
|
68,3
|
76,0
|
39,3
|
2010
|
85,0
|
76,8
|
78,8
|
43,5
|
2011
|
70,8
|
52,8
|
68,8
|
37,0
|
2012
|
77,3
|
59,8
|
72,5
|
35,0
|
2013
|
61,0
|
45,8
|
58,2
|
28,5
|
2014
|
48,8
|
36,3
|
46,3
|
24,0
|
2015
|
15,5
|
10,0
|
20,5
|
14,3
|
2016
|
24,8
|
12,5
|
23,5
|
20,3
|
2017
|
11,8
|
6,0
|
10,5
|
14,0
|
2018
|
7,3
|
4,3
|
6,3
|
13,0
|
O indicador, aparentemente, não
faz justiça ao desempenho de cada gestão na área de segurança pública. Um
exemplo disso é o baixo índice de aprovação da gestão da segurança durante o
período Temer, que fez do tema uma das prioridades de governo. Entre outras
iniciativas, Temer criou o Ministério da Segurança Pública, aprovou o projeto
do SUSP, Instalou o Conselho Nacional de Segurança Pública, iniciou a
intervenção federal no Rio de Janeiro em 2017, com amplo apoio popular. Garantiu
a duplicação dos recursos federais para segurança através das verbas das
loterias e nos últimos dias de governo ainda teve tempo para lançar um novo
Plano Nacional de Segurança Pública, com validade decenal. Para completar, a lenta recuperação econômica iniciada pelo governo jogou para baixo os índices de homicídios em 2018. Na área da segurança, como alguém disse jocosamente, Temer foi o melhor pior presidente dos últimos tempos.
Não obstante ter
sido um governo atuante, sua aprovação média na segurança é bem inferior aos
anos de paralisia na segurança da segunda gestão Dilma. É a impopularidade de
Temer que joga para baixo seu desempenho não apenas na segurança como nas
demais esferas, independente das ações desenvolvidas.
Há diversas razões para explicar
porque o indicador não mede na verdade o desempenho federal na área da
segurança. Diferente das questões da inflação ou desemprego, tradicionalmente a
população identifica o problema da segurança como um problema estadual, uma vez
que são os Estados que controlam as policias civil e militar. Assim, o governo
federal quase nunca é “punido” quando a segurança piora, mas tampouco é
recompensado quando atua nesta área. Este talvez seja um dos motivos que fazem
com que o governo federal fique distante do tema da segurança: um entendimento pragmático
de que seu prestigio é pouco afetado, não importa o que faça nesta área.
Com exceção da intervenção
federal no Rio de Janeiro e das operações GLO, que traz para as ruas tropas do
exército e da Força Nacional, a maior parte das ações federais na segurança tem
pouca visibilidade para a população, que dá pouca importância a questões mais
abstratas como planos de governo, engenharia institucional, custeio da
segurança, bases de dados e outras iniciativas federais – que são de extrema
relevância – mas que são como saneamento básico. Ninguém vê a tubulação embaixo
da terra nem as consultas feitas ao Infoseg...Isto talvez explique em parte porque
o Datafolha encontrou elevado apoio popular dos cariocas à intervenção federal,
sem que isto tenha afetado a aprovação da segurança medida pelo CNI/Ibope.
Fonte: CNI/Ibope
Do ponto de vista metodológico,
isto significa que um indicador genérico de aprovação da segurança é falho,
pois não mede aquilo que pretende medir. Estamos diante de um problema de
validade do indicador, que é diferente do problema da confiabilidade. Para
medir com maior precisão o desempenho do governo federal na segurança, talvez
seja preciso perguntar especificamente sobre o grau de conhecimento e apoio a
cada medida. Com questões do tipo, você já ouviu falar no SUSP, no Ministério
da Segurança, na Intervenção Federal no Rio? Você apoia ou não este tipo de medida?
Do contrário, estaremos medindo apenas o apoio ou rejeição ao governo, de forma
indireta.
É possível que agora em 2019 a
porcentagem de aprovação na área de segurança venha a subir, sob o impacto do
otimismo gerado pela eleição de Bolsonaro, que também elegeu o tema como
prioritário durante a campanha. Este crescimento, como sabemos, provavelmente
terá pouca relação com as medidas tomadas e grande relação com a popularidade
do novo presidente, que inicia seu mandato.
O fato é que, para o bom
desempenho de qualquer política pública, legitimidade do governo e dos
governantes é uma dimensão importante. As séries históricas de aprovação do
governo da pesquisa CNI/Ibope mostram que esta aprovação despencou depois de
2010. Estes limites baixos de aprovação comprometem não apenas os programas de
segurança como qualquer política pública que exija algum nível de apoio e
colaboração popular. Governos considerados ilegítimos e impopulares têm
dificuldades de aprovar e levar adiante seus projetos.
Esperamos que o novo governo
aproveite este capital político gerado pelo otimismo de uma nova gestão para
avançar a agenda da segurança. Pelo que se viu da campanha e das propostas
apresentadas até agora, este otimismo não é compartilhado pelos especialistas
em segurança. O novo governo já começa desmontando a estrutura do longamente reivindicado
Ministério da Segurança e sinaliza flexibilizar por decreto a posse de armas.
Moro foca no combate à corrupção e ao crime organizado, mas não apresenta
nenhum projeto mais abrangente para a segurança pública. Mais um exemplo de que
aprovação popular nas sondagens pode ter pouca relação com a qualidade das
políticas públicas colocadas em prática pelos governos...
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