sexta-feira, 9 de fevereiro de 2024

A segurança pública nas eleições municipais

 

As responsabilidades sobre as áreas de educação e saúde no Brasil são de competência compartilhada das esferas federal, estadual e municipal. Estas competências são reguladas pela Constituição e legislações infraconstitucionais diversas, com a Lei do SUS e a Lei de Diretrizes e Bases da Educação.

 

Assim, apesar de algumas zonas cinzentas, essas leis definem de maneira geral que o município cuida da Educação Infantil e do Ensino Fundamental 1. O Ensino Médio é prioridade do governo estadual, que também gere o Ensino Fundamental 2. A União, por sua vez, fica com as funções de coordenação financeira e técnica desse arranjo, ao mesmo tempo em que patrocina as universidades federais. As competências as vezes são concorrentes e nada impede que os Estados criem suas próprias universidades, mas as responsabilidades básicas são bem divididas entre os entes federativos.

 

Na área da saúde, por sua vez, cabe ao município a administração da saúde básica e da atenção primária. Já o governo do estado fica com a tarefa de gerenciar os leitos e internamentos nos hospitais, além de comandar os atendimentos especializados. Cabe aos municípios o dever de aplicar no mínimo 15% de sua receita na área de saúde e ele é responsável pelo atendimento inicial da população. O município administra as UPAS, o SAMU e demais serviços de saúde da cidade e conduz as campanhas de vacinação. Cuida da fiscalização sanitária e da vigilância epidemiológica. Os papéis de cada um são claros e detalhados, para que não haja superposição de trabalho nem desperdício de recursos.

 

Já na área da segurança pública, apesar de tentativas como a do SUSP – Sistema único de Segurança Pública, inspirado no SUS – não existem obrigações e responsabilidades claras para os municípios, estados e governo federal. A lei diz apenas que os municípios que quiserem, podem criar Guardas Municipais, mas não obriga os municípios a fazerem. Trata-se de uma capacidade, não de uma obrigação. Tampouco os municípios são compelidos a investirem uma porcentagem fixa do orçamento em segurança pública, como ocorre com a saúde ou educação. Não recebem também, obrigatoriamente, parcelas de recursos federais ou estaduais para investir em segurança. O tal SUSP criado pelo governo federal sempre foi mais uma inspiração do que uma realidade. Existem superposições de tarefas, usurpações e desperdício de recursos: a Polícia Militar quer investigar, a Civil fazer policiamento ostensivo, as Guardas querem poder de polícia, não existe compartilhamento de informações entre as instituições. O Sistema Único de Segurança Público nem é sistêmico nem único.

 

As prefeituras que decidiram atuar na área da segurança fazem-no porque querem e por que podem. Foi uma opção, movida em parte pela insatisfação da população com o problema do crime e com a atuação ineficiente dos governos estaduais e federal. Se fizermos um cruzamento do porte do município com as estruturas de segurança – existência de secretaria municipal de segurança ou Guarda Civil- veremos claramente que são os municípios de maior porte e com mais recursos que optaram por atuar na área. Segurança Pública custa caro e é preciso ter condições de arcar com os custos.

 

A tabela abaixo ilustra bem o ponto: dos 48 municípios com mais de 500 mil habitantes, 43 tem Guardas Municipais. Na outra ponta, apenas 38 dos 1253 municípios com menos de 5 mil habitantes afirmaram ter Guardas. No total, cerca de 21,3% dos municípios disseram contar com Guardas.

 

Informações acerca da existência e da configuração da Guarda Municipal nos municípios brasileiros

Faixas de tamanho da população dos municípios

Qtd. de municípios

Municípios que possuem Guarda

Efetivo total da Guarda

Até 5 000

1.253

38

342

De 5 001 a 10 000

1.199

105

1.421

De 10 001 a 20 000

1.345

260

4.969

De 20 001 a 50 000

1.100

347

12.106

De 50 001 a 100 000

349

191

11.984

De 100 001 a 500 000

276

204

29.443

Mais de 500 000

48

43

39.245

Brasil

5.570

1.188

99.510

Fonte: MUNIC/IBGE -2019

 

 

 

 

 

Este crescimento do envolvimento do município com a segurança ocorreu principalmente a partir dos anos 80, impulsionado pela alta da criminalidade no país. Eleitores não querem saber se o crime é responsabilidade federal, estadual ou municipal, mas que o problema seja resolvido. Houve uma pressão dos eleitores para que tanto as prefeituras quando o governo federal assumissem responsabilidades pela segurança. Muitas prefeituras ajudavam com recursos as polícias estaduais – cedendo funcionários, imóveis, ajudando com combustível para as viaturas, pagando aluguéis, etc. – mas no final não conseguiam influenciar as ações municipais em segurança. Estes fatores ajudam a entender porque os municípios começaram a investir diretamente na área, que vai muito além da presença ostensiva das Guardas nas ruas.

 

E o que fazem os municípios quando decidem investir em segurança? Segundo a pesquisa MUNIC do IBGE, eles primeiro criam as estruturas e instituições, como Secretarias Municipais de Segurança, Guardas Municipais, Fundo Municipal de Segurança, Conselho Consultivo Municipal, Conselhos de Segurança nos bairros, Planos Municipais de Segurança Pública, etc.

 

Há também um esforço de integrar as demais pastas numa perspectiva preventiva, pensando as ações de segurança em conjunto com o serviço social, esportes, educação, iluminação pública, limpeza e assim por diante. Às vezes são os próprios prefeitos que reúnem periodicamente todos os envolvidos para monitorar os resultados, alocar recursos e cobrar ações.

 

O foco no combate à degradação física de cidade através de estratégias CPTED (prevenção criminal através do desenho ambiental) e da degradação social – fiscalização das cracolândias, camelôs ilegais, “pancadões”, flanelinhas, etc. também é uma perspectiva bastante utilizada para a prevenção pelas cidades, na linha da teoria das janelas quebradas.

 

As prefeituras têm investido bastante em tecnologias como câmeras de monitoramento, centrais de despacho de viaturas, leitores óticos de placas, aplicativos de celular, drones, georreferenciamento criminal, sistemas de registros de ocorrências digitalizados e outros equipamentos e recursos tecnológicos.

 

É possível atuar também através de mudanças na legislação, regulamentando problemas como poluição sonora, venda de álcool, invasão de reservas ambientais, segurança de grandes eventos e impondo regras aos estabelecimentos semipúblicos, como clubes e shoppings centers.

 

Qualquer que seja a iniciativa é preciso garantir que tenha sido avaliada e que conte com evidências robustas sobre sua eficácia, regra válida para toda e qualquer área da administração pública.

 

As eleições municipais de 2024 se aproximam e segurança pública estará entre as principais preocupações dos eleitores, o que estimula os candidatos a incluírem propostas nesta área em suas campanhas eleitorais. A situação dos municípios é muito diversificada, tanto em termos de recursos financeiros como de criminalidade e estrutura para intervir na segurança e não existe uma fórmula que sirva para todos.

 

Atuar na área de segurança é uma opção, não uma obrigação legal para os Municípios. O mesmo vale para os candidatos. Quem tiver boas propostas e boa atuação na área, pode garantir aqueles votos que farão a diferença entre a vitória e a derrota!

 

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