Esta semana o ISP divulgou as
estatísticas de criminalidade do Rio de Janeiro, relativas ao mês de abril. Não
obstante o crescimento de homicídios, furtos e estupros, os números de modo
geral confirmam a tendência de queda da criminalidade no RJ, iniciada em meados
de 2017.
Comparando com abril de 2017, os
roubos caem -13%, roubos de veículos caem -5%, furtos - 9%, latrocínios -36% e
lesões corporais dolosas -6%. Por sua vez, o furto de veículos, que vinha de
uma longa tendência de queda, teve 4% de aumento, os estupros 18% e os homicídios
dolosos, 10%. No nosso índice geral (que leva em conta as variações médias dos
diversos crimes) observamos uma ligeira queda de -2,4%, menor do que nos meses
anteriores.
Os índices oficiais não são de
todo consistentes com os 25% de aumento de “tiroteios” nos três meses de
intervenção, levantados pela plataforma colaborativa “fogo cruzado”, que mapeia
relatos sobre tiroteios com base em diversas fontes. Embora tenham recebido
bastante atenção da imprensa, os 25% de crescimento dos tiroteios foram calculados
com base nos três meses anteriores e não com relação ao mesmo período do ano
anterior. A metodologia de contagem do aplicativo não é clara, por exemplo, com
relação aos cuidados para evitar a dupla contagem de casos, no caso de várias
denúncias sobre um mesmo evento. Além disso, a própria intervenção pode ter
estimulado o aumento de relatos, de modo que, embora relevante para o
mapeamento geográfico, os dados do aplicativo são menos confiáveis para apontar
tendências temporais.
A queda de crimes no RJ, como já
apontamos, é anterior à Intervenção federal e está em linha com a queda geral
da criminalidade nos demais estados, após o término do ciclo econômico
recessivo. A pergunta relevante é se a Intervenção tem algum papel relevante
nesta queda. Como ressaltado em comentários anteriores, essa avaliação é difícil
de ser feita, pois é necessário o controle sobre diversos fatores simultâneos.
De todo modo, numa avaliação
muito simplista, tomemos as tendências gerais de roubo nos últimos meses, para
os estados que divulgam o dado pela internet. As séries histórias de roubos de
Rio de Janeiro e São Paulo são bastante parecidas (cointegradas): ainda que os
volumes sejam diferentes, as variações não o são.
O gráfico abaixo traz as
variações dessazonalizadas dos roubos no Rio e em SP, tomando uma média móvel
de seis meses, de 2001 a 2018. Uma rápida olhada é suficiente para ver como
tendem a variar em conjunto, bem como os efeitos deletérios das crises
econômicas de 2009 e 2014.
Assim, uma estratégia simplória para
averiguar o impacto da Intervenção seria comparar as variações nos dois
Estados. Se a conjectura de que a Intervenção trouxe algum impacto for
verdadeira, esperaríamos uma variação negativa maior no Rio de Janeiro do que
em São Paulo ou nos demais Estados. A velocidade da queda no Rio deveria ser
maior também em função do fenômeno de regressão à média: o crescimento anterior
dos roubos no RJ foi muito maior do que nos demais Estados em 2016 e 2017, de
modo que as quedas deveriam ser mais acentuadas, por mero artifício
estatístico.
Os dados, no entanto, não
corroboram até o momento a interpretação de que a Intervenção tenha alguma
relevância nesta queda dos roubos.
A tabela mostra a tendência
generalizada de queda nos roubos em todos os Estados analisados, a partir da
metade de 2016 (note-se que a queda teve início tardio do RJ). Analisando
apenas os últimos três períodos disponíveis em cada Estado, observamos na
última linha que a queda dos roubos no RJ, embora crescente, foi em média da
ordem de -9,6% durante o período da Intervenção. Em São Paulo, a variação nos três
últimos pontos foi de -18,4%.
A variação
negativa no Rio foi equivalente às observadas no MS, CE, RO e BA, mas inferior
às de SP, MG, RS, MT, GO, PR, DF e SC. Em média, tomando os últimos três
pontos, a variação dos roubos foi de -18,8%, o dobro da queda carioca. Embora
simplista, a análise sugere que a tendência de queda observada no Rio apenas
acompanha a tendência geral de diminuição dos crimes patrimoniais pós-crise e
que a Intervenção, aparentemente, tem pouco a ver com os resultados. O
desempenho do Rio também é comparativamente menor no caso dos homicídios
dolosos e roubo de veículos, ainda que estes últimos estejam diminuindo. Em suma, ainda é cedo para
avaliarmos o impacto da Intervenção federal no RJ, mas até o momento são poucos
os indícios de que tenham sido significativos.
Um complicador para a análise é
que o Rio chegou tarde neste ciclo virtuoso de queda da criminalidade, que pode
estar se esgotando. Diversos indicadores econômicos sugerem que a retomada da
economia foi tímida, um voo de galinha, e que talvez vejamos uma retomada econômica
em forma de “W”. Já é possível visualizar esta forma de “W” no gráfico de
roubos de alguns Estados: crescimento forte em 2014 e 2016 e quedas em 2015 e
2017. Em 2018, os roubos estão ainda em queda na maioria dos estados, mas é
possível que tenhamos chegado ao ponto mais baixo da queda. As linhas do
gráfico de alguns estados já embicam para cima, sugerindo desaceleração da
queda nos próximos meses e, eventualmente, uma inversão de tendência no final
de 2018.
O fato é que, qualquer que seja a
tendência, para avaliar o que acontece no Rio é preciso levar em conta o que
ocorre nos demais Estados, uma vez que a criminalidade responde muito mais ao
contexto sócio econômico geral do que às políticas de segurança. Tanto menos às
que mostram tantas fragilidades conceituais, como a Intervenção no Rio tem
mostrado até o momento.