Encerrou-se
hoje oficialmente, 27 de dezembro, a intervenção federal na segurança pública
do Rio de Janeiro. Ela teve início em fevereiro de 2018 e durante estes 11
meses investiu 890 milhões de reais nas polícias estaduais, o que representa
cerca de cinco vezes o orçamento anual da polícia carioca. O General
interventor ganhou hoje sua medalha e sai, segundo ele próprio, com a missão
cumprida.
Apesar da
carência de dados atualizados nacionais, já é possível fazer algumas
observações sobre o desempenho da medida, comparando com desempenho de alguns
estados no mesmo período.
Antes é preciso
fazer uma rápida digressão sobre a tendência criminal nos anos anteriores, para
entendermos melhor o contexto. Em análises anteriores mostramos com gráficos
como a variação da criminalidade, desde a crise de 2014, vem se assemelhando a
um formato de “W”: pico em 2014, queda em 2015, nova elevação em 2016, queda em
2017 e 2018. Sendo correta a análise, estamos chegando ao fim do período de
queda e começaremos a observar uma inversão de tendência em 2019. Em alguns estados,
já é possível observar a desaceleração da queda, tanto de roubos quando de
homicídios.
Voltando ao
caso carioca, enquanto a maioria dos estados iniciava um período de queda dos
roubos em 2017, no Rio de Janeiro os roubos estavam em forte crescimento, destoando
do cenário geral. De todo modo, quando a intervenção federal foi decretada em março
de 2018, observe-se que os roubos já estavam desacelerando no Rio, acompanhando
timidamente a tendência “nacional”.
A tabela abaixo
traz a variação dos roubos por Estado, com relação ao mesmo período do ano
anterior. Suavizamos as variações tomando médias móveis de 3 meses, para
ilustrar melhor a tendência e estimar os dados de dezembro, ainda não
publicados na maioria dos Estados.
A última linha
traz a variação média dos roubos, pegando o período de março a dezembro de
2018. Em média, os roubos caíram 17% neste período, nos estados analisados (o
que explica em parte a queda dos homicídios, como veremos no próximo quadro).
No Rio de Janeiro, a queda no período foi de aproximadamente 9%, menor do que a
média geral. Com efeito, dos estados analisados, apenas Bahia e Amazonas
tiveram um desempenho pior do que o carioca. Em Minas, Mato Grosso, Goiás e
Santa Catarina, a queda dos roubos chegou a 30% com relação ao mesmo período do
ano anterior.
Assim, no que
tange aos roubos, os interventores tiveram que lidar com uma situação pregressa
mais aguda. Mas já entraram no Estado com numa tendência de queda e nada parece
indicar que tenham influído significativamente nesta tendência. Esta ausência
de impacto também é evidenciada quando acompanhamos as tendências de roubo
tomando apenas RJ e SP, que são bastante integradas (ou cointegradas).
O gráfico
abaixo compara a variação dessazonalizada dos roubos em ambos os estados.
Note-se no gráfico: 1) o formato de “W” depois de 2014; 2) a desaceleração da queda dos roubos
nos últimos meses e 3) a similitude de comportamento das curvas de RJ e SP,
mesmo durante o período da intervenção federal.
O comportamento
dos homicídios foi bastante parecido ao dos roubos. A análise é confundida por
conta de surtos de homicídios provocado pela guerra de facções em alguns
Estados, como Amazonas e Ceará. Mas de modo geral observamos um crescimento nacional
moderado dos homicídios em 2017, desacelerando a partir de outubro de 2017 até
se transformar em queda em 2018.
Se tomarmos o
período de março a dezembro de 2018 – período da intervenção - a última linha
nos indica que os homicídios dolosos caíram em média 15% nos Estados
analisados. Novamente aqui, vemos que a) o RJ acompanhou esta tendência de
queda nacional, b) que o processo de queda é anterior à intervenção federal e c)
que a magnitude da queda é menor do que a dos demais estados (-4,4%). Apenas o
CE teve uma queda tão baixa quanto o Rio no mesmo período, mas isto por conta
da excepcionalidade do surto criminal no Estado, já superado.
Aqui também,
não é possível observar nenhum impacto que possa ser atribuído especificamente à
intervenção federal. Como no caso dos roubos, o Rio parece ter seguido a
tendência nacional de queda e sua tendência inercial anterior. Em ambos indicadores,
o desempenho foi inferior à média dos demais Estados.
Missão cumprida?
É preciso analisar um conjunto de indicadores mais amplos para analisar a eficácia
da Intervenção, aguardar o impacto dos investimentos efetuados e avalia-la
também com relação a outros aspectos conceituais, como a questão do legado
estruturante, (ou ausência dele), do acirramento da violência policial, da
sensação de segurança, entre muitos outros ângulos e abordagens possíveis.
Por enquanto, o
que podemos inferir - com base limitada nos indicadores roubos e homicídios – e
na comparação com os demais estados, no período analisado, é que não é possível
até o presente momento notar mudanças significativas de tendências nas séries
históricas, que possam ser atribuíveis à Intervenção Federal.
É possível que
num futuro próximo vejamos algum efeito dos 890 milhões investidos no Estado,
mas até o momento estes investimentos não parecem ter afetado roubos e
homicídios. As quedas no Estado são maiores quando analisamos isoladamente
roubo de cargas e latrocínios, mas infelizmente não dispomos de dados
comparativos dos outros estados para comparar com o desempenho carioca.
As tendências
no Rio de Janeiro parecem antes acompanhar as tendências nacionais, não
obstante o Estado ter sentido de forma mais aguda que os demais o contexto da
crise econômica de 2014, agravada pela crise fiscal e moral do Estado.
A recuperação
lenta e gradual da economia parece ser a explicação de fundo para a queda tanto
dos roubos quanto dos homicídios na maioria dos Estados em 2018. E da economia,
em grande parte, dependerá a continuidade ou interrupção deste ciclo.
Nenhum comentário:
Postar um comentário