A reforma eleitoral de
2015 e seu impacto nas eleições municipais
As eleições municipais de 2016 foram das mais “baratas”
dos últimos tempos. Segundo o TSE, os gastos na campanha de 2016 somam R$ 2.131
bilhões, em contraste com os R$ 6.240 bilhões gastos nas eleições municipais de
2012.
O principal motivo da redução foi a mudança da legislação eleitoral, que
limitou as contribuições apenas às pessoas físicas e impediu a doação de
empresas. Outros fatores importantes são a crise financeira e os efeitos da
operação Lava Jato, além das inúmeras outras restrições de gastos promovidas
pela minirreforma Eleitoral 2015 (Lei nº 13.165).
Em outro artigo já detalhamos as principais alterações da legislação e
mostramos, tomando as eleições para deputados estaduais e federais, que há uma
estreita correlação entre o número de votos recebidos pelo candidato e os
recursos gastos na campanha. Esta forte correlação entre recursos e votos nas
eleições produz sérios questionamentos sobre a legitimidades dos resultados das
urnas e reduzir a influência do poder econômico nas campanhas foi um dos
principais objetivos da minirreforma de 2015.
A questão é: quão bem-sucedida foi a reforma para tornar as condições de
disputa mais igualitárias? Vimos que ela reduziu bastante os gastos em números
absolutos, o que já é por si relevante (estamos falando obviamente dos gastos
oficiais). Mas o que ocorreu com a relação gasto-voto? Ainda se elegem aqueles
que gastam mais?
Os dados ainda são parciais pois o TSE não disponibilizou a prestação
final de contas dos candidatos nem a base de resultados completa para download,
de modo que usamos aqui apenas os dados dos 1882 candidatos a vereador em São
Paulo. Note-se também que esta é a primeira eleição municipal em que analisamos
a relação gasto-voto, de modo que os dados não são totalmente comparáveis, pois
as amostras anteriores provem de eleições para deputados. A tabela abaixo
resume os resultados.
eleição
|
ano
|
valor
|
intercept
|
slope
|
R.
|
votos
|
custo por voto
|
dep estadual
|
2014
|
R$ 1.000.000,00
|
4662
|
0,046
|
0,43
|
50.662
|
R$ 19,74
|
dep estadual
|
2010
|
R$ 1.000.000,00
|
3500
|
0,077
|
0,63
|
80.500
|
R$ 12,42
|
dep estadual
|
2006
|
R$ 1.000.000,00
|
6557
|
0,13
|
0,56
|
136.557
|
R$ 7,32
|
dep federal
|
2014
|
R$ 1.000.000,00
|
7146
|
0,039
|
0,48
|
46.146
|
R$ 21,67
|
dep federal
|
2010
|
R$ 1.000.000,00
|
6442
|
0,053
|
0,61
|
59.442
|
R$ 16,82
|
dep federal
|
2006
|
R$ 1.000.000,00
|
10140
|
0,098
|
0,55
|
108.140
|
R$ 9,25
|
vereador
|
2016
|
R$ 1.000.000,00
|
1185
|
0,032
|
0,39
|
33.185
|
R$ 30,13
|
O coeficiente de determinação R2 mostra que das sete eleições
analisadas, esta última é a que apresentou a menor correlação entre gastos e
votos ( r2= 0.39) embora a distância seja pequena com relação a eleição para
dep. Estadual em 2014 (0.43). Alguns poucos casos extremos podem impactar na
força da relação e no coeficiente. De todo modo, em conjunto com a redução no
volume absoluto de gastos, fica a sugestão de que as novas regras podem ter
ajudado a enfraquecer ligeiramente o poder econômico nas eleições.
Infelizmente, a influência do dinheiro ainda fala alto. Os candidatos a
vereador, como se vê na tabela, gastaram em média 76 mil reais e tiveram em média
(intercept) 1185 votos. Um candidato hipotético com gasto de 1 milhão obteve
aproximadamente 33 mil votos, a um custo de R$ 30,00 reais por voto. Cerca de
40% da variação na votação dos candidatos pode ser “explicada” pelos gastos de
campanha, o que é ainda bastante elevado.
O gráfico de dispersão abaixo traz a quantidade de votos no eixo vertical
e gastos na horizontal – excluindo somente 5 candidatos extremos - e ilustra
bem o ponto.
É claro que existem exceções à regra: a votação gigantesca no vereador
Eduardo Suplicy, pelas regras eleitorais, fez com que vários candidatos do PT
fossem eleitos, independentemente dos gastos – tanto que, se isolarmos o PT, a
relação gasto-voto cai para metade (r2 = 0.19). Fernando Holiday recebeu 48 mil
votos declarando ter gasto 12 mil reais na campanha. No outro extremo, Thammy
Miranda gastou um milhão e quatrocentos, mas só obteve 12.400 votos. Mas, como
dito, estas são exceções. De modo geral foi eleito quem gastou mais, como de
costume.
Isto significa que ainda há muito a aperfeiçoar na legislação eleitoral
para garantir condições equânimes de disputa e evitar distorções: evitar que
puxadores de votos ajudem a eleger candidatos com poucos votos, colocar um teto
menor para o máximo de gastos permitidos, colocar um teto para investimentos
pessoais na campanha, que favorece os candidatos ricos, etc. No limite, o
financiamento público das campanhas – medida impopular e pouco compreendida –
pode ser a melhor maneira de tornar as condições da disputa mais igualitárias,
desde que se encontre uma fórmula “justa” para distribuir os recursos entre os
partidos e candidatos.
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