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segunda-feira, 3 de setembro de 2018
Crescimento dos homicídios no N e NE: droga, crime organizado ou "contexto"
Decisões humanas não são tomadas no vácuo, mas sempre dentro de um contexto. Isto explica, por exemplo, porque uma lei pode “pegar” num lugar e época e “não pegar” em outros.
Analisemos nesta perspectiva a questão do Estatuto do Desarmamento, lei federal aprovada em 2003 proibindo o porte de arma em todos o país. Passados alguns anos vimos os homicídios caírem em alguns estados – especialmente no Sudeste – e crescerem muito nas regiões Norte e Nordeste.
Como é possível que uma mesma lei, válida em todo território nacional, produza efeitos diferentes em diferentes lugares? Meu argumento nos últimos anos tem se fundamentado na questão do contexto.
Do ponto de vista do “cidadão de bem”, que portava arma para sua proteção pessoal, o Estatuto aumentou o “custo” de andar armado, tornando o porte ilegal crime inafiançável. Dado este aumento no custo, o indivíduo racional faz o cálculo de quando vale a pena continuar a andar armado. A decisão depende do contexto: se a criminalidade está sob controle, a sensação de segurança estável e a polícia na rua fazendo busca e apreensão de armas, é melhor deixar a arma em casa do que se arriscar andando armado. Por outro lado, se a criminalidade está elevada, sinto-me inseguro e percebo uma baixa capacidade de implementação da medida por parte da polícia, a tendência é arriscar e continuar andando armado, pois o risco de ser pego é baixo. O quadro abaixo ilustra esquematicamente a decisão.
Crime e insegurança Probabilidade de captura Decisão “racional”
Alto Baixa Andar armado
Baixo Alta Deixar arma em casa
Existem também as situações ilustradas pelas diagonais, em que a criminalidade é baixa e a probabilidade de captura também é ou a situação contrária, com crime e insegurança altos e probabilidade de captura também. Estas situações ambíguas dificultam uma tomada clara de decisão e nestes casos a propensão individual ao risco pode ser mais decisiva do que o contexto para definir a decisão. Além de contexto e propensão ao risco, dezenas de outros fatores podem influenciar a decisão de andar armado, entre elas as crenças individuais, hábitos, risco profissional, possibilidade de se proteger de outras maneiras, etc. Mas de modo geral o esquema se aplica adequadamente ao dilema individual.
Estas decisões individuais, quando agregadas, conseguem explicar as dinâmicas regionais dos homicídios no Brasil nas últimas décadas? Existem explicações diferentes para o fato de os homicídios terem decrescido no Sudeste e aumentado intensamente no Norte / Nordeste. Como tratamos em artigos anteriores, há quem procure explicar estas diferenças regionais em termos de presença do crime organizado e sua capacidade de regular conflitos, ou ainda pelo grau de crescimento do tráfico de drogas, em especial do crack, pelo país.
Por minha vez, propus em trabalhos anteriores um esquema de interpretação mais complexo, baseado na centralidade da quantidade de armas em circulação e na questão do contexto: num grupo de estados, vimos um crescimento econômico equilibrado nas últimas décadas. A criminalidade patrimonial manteve-se sob controle, assim como a sensação de insegurança da população. A polícia era suficientemente organizada para reprimir o crime e implementar o controle de armas através de buscas e apreensões. Neste contexto 1, a opção racional, como vimos, é deixar a arma em casa. Com menos armas em circulação, observamos neste grupo de estados a queda ou estabilidade dos homicídios.
Por outro lado, no contexto 2, observamos um crescimento econômico acelerado nas últimas décadas, ao que se seguiu um aumento de oportunidades para os crimes patrimoniais. Este aumento da renda pode ter contribuído também para o aumento do consumo de drogas e álcool. O súbito aumento dos roubos fez crescer a sensação de insegurança da população. Ao mesmo tempo, encontramos polícias despreparadas tanto para combater a criminalidade crescente quando para colocar em vigor o Estatuto. Neste contexto 2, a decisão racional foi continuar a andar armado ou comprar uma arma para defesa pessoal. Com o aumento das armas em circulação, vemos no momento seguinte o crescimento dos homicídios, em boa parte interpessoais. Vemos assim contextos diferentes implicando em decisões individuais diferentes e resultados agregados igualmente diferenciados.
Já mostramos algumas evidências deste quebra-cabeças em trabalhos anteriores. Dados mais recentes parecem corroborar esta interpretação. Na tabela abaixo, os Estados estão elencados segundo a variação dos homicídios dolosos, comparando médias do período 2001/2003 com médias do período 2016/2018.
Nas demais colunas da tabela vemos: presença do PCC no Estado (segundo a classificação de Manso e Dias); variação do valor adicionado do PIB entre 2002 e 2015; variação do roubo de veículos entre os períodos 2001/2003 e 2016/2018; % dos entrevistados na pesquisa de Vitimização Senasp de 2014 que avaliam que a criminalidade aumentou no Estado; variação nas médias de homicídio doloso e tráfico, ambos comparando os períodos 2001/2003 com 2016/2018
Como sugerem os dados, no contexto 1 temos um grupo de dezoito estados onde os homicídios aumentaram de 40 a 600% desde o início dos anos 2000. Destes, 15 tiveram crescimento acentuado do PIB no período. Não por acaso, as variações nos roubos de veículos foram maiores neste grupo, o que deve ter contribuído para o aumento acima da média na sensação de insegurança, como sugerem os dados da pesquisa de vitimização de 2014. Mostramos alhures que a polícia era mais desorganizada nestes estados (orçamento menor, menos policiais por habitantes, menor taxa de prisões, etc.) e que a armas em circulação, medidas indiretamente pelas % de suicídios ou homicídios cometidos com armas, parecem ter aumentado. Este é o contexto onde a decisão de andar ou não armado teve que ser tomada. E a decisão parece ter sido manter ou adquirir arma, como mostra o crescimento dos homicídios. Santa Catarina parece ser um ponto fora da curva neste primeiro grupo, pois teve baixo crescimento econômico. Mesmo assim, roubo de veículos e sensação de insegurança cresceram acima da média no Estado, o que pode explicar a variação dos homicídios. Rio Grande do Sul e Minas Gerais estão na parte inferior da lista do contexto 1 e poderiam talvez ter sido classificadas no contexto 2: o crescimento econômico foi baixo, assim como a variação nos roubos de veículos e a sensação de insegurança tem nível intermediário. Ambos tiveram crescimento moderado dos homicídios na década.
No contexto 2 temos um grupo de 9 Estados com quedas ou crescimentos pequenos dos homicídios dolosos. Com exceção do MS, o crescimento do PIB foi mais moderado aqui. A maioria teve crescimento abaixo da média no roubo de veículos, que chega a cair em SP no período. Em consequência da estabilidade do crime patrimonial, a sensação de insegurança mensurada em 2014 fica abaixo da média. Note-se que há um estado nordestino no grupo, PE, em contraste com a tendência regional. Uma política de segurança bem-sucedida pode ter contribuído ali para contrabalançar os efeitos do crescimento da renda e dos crimes patrimoniais. Outra “exceção” seria Rondônia, mas note-se como o estado parece confirmar a teoria: apesar de ficar no Norte, o crescimento econômico foi baixo, assim como o roubo de veículos e insegurança. Em consequência, vemos uma ligeira queda nos homicídios. Estas tendências encontraram um sistema de justiça criminal mais preparado para controlar o crime e impor o Estatuto. Neste contexto, as armas ficaram em casa e os homicídios caíram ou cresceram a taxas reduzidas.
É preciso de mais e melhores dados para corroborar a hipótese do contexto, mas ela parece explicar melhor as evidências encontradas do que as hipóteses do crescimento do tráfico de drogas ou da expansão do crime organizado. Como sempre nestes casos, estamos falando de fenômenos multicausais e é possível que as três hipóteses tenham alguma validade, em alguma medida e que exista uma interação entre elas. O que não significa que sejam todas igualmente relevantes. Um diagnóstico preciso é necessário pois de cada um decorrem diferentes políticas públicas para conter o crescimento dos homicídios no Norte/ Nordeste.
quinta-feira, 23 de agosto de 2018
Senta que lá vem correlação: governo disponibiliza dados criminais nacionais
Desde que foi criada em 1997, a Secretaria Nacional de Segurança Pública passou a coletar dados criminais e de atividades policiais das secretarias de segurança pública estaduais, na tentativa de elaborar uma política nacional de segurança, identificar tendências ou avaliar impacto de projetos patrocinados pelo Ministério da Justiça, entre outros objetivos. Tenho comigo planilhas de coleta da Senasp de 1998, solicitando dados retroativos a 1996, de modo que podemos datar dai o primeiro esforço sistemático de construção de um sistema nacional de indicadores de segurança. Nem tudo na história do Brasil começou com a “mudança de paradigma” das gestões petistas e nem parou depois delas.
Em 2002, na minha curta passagem pelo Ministério da Justiça na gestão do Secretário Jose Vicente da Silva, organizamos com base nas planilhas envidas pelos Estados o que foi o primeiro e último balanço anual de tendências criminais nacionais, divulgando atravé de um boletim e coletiva de imprensa no auditório do MJ os dados criminais dos estados e capitais, relativos aos anos de 2000 e 2001.
De 2003 em diante houve um aperfeiçoamento gradativo na coleta, padronização, cobertura e sistematização das estatísticas criminais e de atividades policiais. A partir de 2004 os dados passaram a ser coletados mensalmente, através de formulários eletrônicos, para todos os municípios maiores de 100 mil habitantes e desde 2013 para todos os municípios. Não obstante a melhora na qualidade da informação, estas nunca mais foram publicamente analisadas e comentadas pelo governo federal, seja por receio de que os números tivessem ainda problemas de qualidade, seja por receio de que fossem bons o bastante para mostrar o desgoverno que ocorria em alguns estados. De todo modo, o papel do governo federal é de coletar, padronizar e divulgar as informações e não necessariamente de interpretá-las.
Em 2006 um grupo de pesquisadores do qual fiz parte fundou o Fórum Brasileiro de Segurança Pública e no ano seguinte publicamos o primeiro Anuário Brasileiro de Segurança, trazendo para a sociedade de civil – com o apoio do governo – a tarefa de coletar, sistematizar e analisar alguns dados nacionais, no que tange à macrotendências estaduais e anuais. Em 2011, através do módulo web do Sinespjc, o governo federal disponibilizou para consulta on-line alguns indicadores criminais, novamente por ano e agregados em nível estadual. Em ambos os casos – anuário e Sinespjc - estamos falando em dados anuais, agregados por estado e nem sempre atualizados com a periodicidade necessária para o planejamento de políticas de segurança pública. Pouco adequados também para uma análise mais minuciosa da criminalidade pelo mundo acadêmico, que se valeu frequentemente dos dados do Datasus ou dos governos estaduais mais transparentes para a realização de pesquisas.
Todo este preâmbulo é para destacar a novidade na forma atual de disponibilização dos dados coletados pelo Sinespjc, que poucos se deram conta ou utilizaram. Vinte e um anos após a criação da Senasp , através do portal de Dados Abertos do governo federal, desde 2018 já é possível acessar a série histórica mensal de dados criminais coletadas pelo governo federal (de 2004 ao primeiro semestre de 2017), para todos os municípios, para as naturezas homicídio doloso, roubo de veículo, furto de veículo, roubo seguido de morte, estupro e lesão corporal seguida de morte. (Dados aqui para os interessados: https://public.tableau.com/views/Sinespnovo/variaotaxalinha?:embed=y&:display_count=yes)
Sim, são poucos os indicadores disponibilizados e a base não está atualizada. Tem lacunas e problemas de qualidade. Mas o ótimo é inimigo do bom e nada como a luz do sol sanear as deficiências. É um avanço enorme com relação aos últimos anos. Não é preciso pedir as informações para ninguém e os dados estão num nível de granularidade e desagregação que não tínhamos até agora, exceto do que tange as mortes, contabilizadas pelo Datasus e seguindo a definição do setor de saúde.
Não vamos aqui explorar a base em detalhes, mas apenas ilustrar o seu potencial. Nos parágrafos abaixo, tomamos os seis indicadores criminais disponibilizados pelo Sinespjc, para os anos 2014 a 2016 e correlacionamos com a renda per capita do município, coletada pelo IBGE em 2010. Como se sabe, renda tem um impacto ambíguo sobre criminalidade e seu crescimento, segundo a literatura criminológica: tende a diminuir os crimes contra a pessoa (que são poverty driven) mas aumentar os crimes patrimoniais, que são opportunity driven. Rouba-se nos locais onde há algo para ser roubado. (mostramos isso com os dados dos estados em 2002. https://super.abril.com.br/comportamento/o-mapa-da-violencia/)
Os dados subnacionais parecem corroborar este padrão. Para todos os anos, a correlação é positiva entre renda per capita, por um lado, e a taxa de furto e roubo de veículos por 100 mil habitantes nos municípios. E negativa com as taxas de homicídios dolosos e de lesão corporal seguida de morte. Como esperado, os municípios mais ricos têm taxas elevadas de roubo e furto de veículos e taxas baixas de homicídios e lesões. As correlações bivariadas são estatisticamente significativas e particularmente fortes no caso dos furtos de veículos.
Por outro lado, os dados sugerem uma relação positiva entre renda per capita do município e taxa de estupros e negativa com latrocínio (roubo seguido de morte), contrariando o esperado. É possível que seja um “artifício” estatístico pois estupros sofrem bastante com o problema da subnotificação pelas vítimas e o número de casos absolutos de latrocínios é pequeno, provocando flutuações bruscas.
Mas é possível também que os dados estejam mostrando algo sobre o fenômeno em si: a notificação de estupros varia com a renda da vítima (quanto mais rica e escolarizada, maior a propensão a notificar o crime às autoridades). Assim, talvez a taxa de estupros seja maior nos municípios de maior renda porque a notificação dos casos é maior nestes municípios, provocando um sinal “positivo” quando deveria ser “negativo”.
No caso dos latrocínios, sempre pensamos o crime como um roubo que não deu certo, cuja motivação é basicamente patrimonial. Assim, esperaríamos uma tendência parecida com os demais crimes patrimoniais: maior a renda, mais objetos a serem roubados, maior a taxa de latrocínio. Mas encontramos, como visto, uma relação inversa com a renda, tal como nos crimes contra a pessoa. A relação inversa se manifesta claramente em todos os anos (inclusive 2013 e 2017, não mostrados no gráfico) e as amostras incluem mais de 600 municípios. Ou seja, é possível que não seja um artifício estatístico e que o latrocínio expresse algo além da motivação econômica. Haveria nele alguma coisa de ódio social ou raiva, mesmo que a vítima seja desconhecida? Algo a mais do que um acidente de percurso ou descuido durante um roubo?
Não é o caso de esmiuçar estas associações neste espaço uma vez que o intuito era apenas ilustrar o potencial da base Sinespjc municipal e mensal para a análise. Com este nível de desagregação espacial e frequência temporal novas pesquisas são viáveis e os resultados tornam-se mais robustos. Podemos testar o efeito de práticas e políticas que foram implementadas em apenas alguns municípios (por exemplo, efeito da existência de secretarias municipais de segurança sobre os crimes). Ou que vigoraram durante um período específico de tempo (por exemplo, impacto dos meses de recessão econômica sobre os crimes). Pesquisas que as bases de dados estaduais e anuais não permitiam.
Esperamos que a disponibilização de dados seja mantida pelo próximo governo federal, incluindo cada vez mais indicadores criminais e dados cada vez mais completos e atualizados. Sem bons dados não existe política eficaz de segurança. É importante produzi-los e divulga-los, mesmo quando eles não mostram aquilo que o poder público gostaria. Já vi governos estaduais que divulgam dados criminais quando estão bons e voltam a omiti-los quando estão ruins. A falta de transparência só ajuda a agravar o problema, quebrando o termômetro para esconder a febre. Mas ela tende a voltar. E se não for bem diagnosticada e a tempo, termina por matar o paciente.
terça-feira, 21 de agosto de 2018
Já disponível na Amazon a versão digital do "Apontamentos para a Reforma da Segurança"
https://www.facebook.com/events/234447367258155/
O Brasil precisa de uma reforma urgente na Segurança Pública e as fundações partidárias deveriam todas estar engajadas na busca de soluções para o problema, uma vez que financiadas com recursos públicos. Na Fundação Espaço Democrático Kahn tem a oportunidade de acompanhar e discutir cotidianamente – em artigos e seminários com especialistas – diversos temas relevantes para esta reforma nos últimos seis anos. Como Fundação partidária, o Espaço Democrático não faz ciência pela ciência, mas está voltado para a discussão de temas práticos que possam influenciar as políticas públicas de segurança. Desnecessário alertar que as opiniões aqui emitidas são do autor, conselheiro da Fundação, e não da própria ou do Partido a que ela está vinculada, o PSD.
Entre outros materiais de interesse este volume traz os dados da pesquisa realizada em 2017 para a Fundação sobre o que os especialistas em segurança pensam a respeito de dezenas de iniciativas para a área. Os resultados podem ajudar a identificar uma agenda mais ou menos consensual para iniciarmos a aludida reforma. Discutem-se também as tendências criminais recentes e como elas são influenciadas pelos ciclos econômicos, a organização em rede dos grupos pró e contra armas na internet, a política de “guerra às drogas” e alternativas para o problema, as iniciativas federais na segurança tais como a intervenção no Rio de Janeiro e as operações de Garantia da Lei e da Ordem.
O volume traz também dados empíricos sobre o padrão dos homicídios nos municípios e como a disponibilidade de armas explica estes padrões, reflete sobre a importância dos dados georeferenciados para o planejamento das operações policiais e sobre os motivos pelos quais as pessoas obedecem ou não às leis. Procura fazer ainda uma rápida explanação sobre possíveis critérios para avaliarmos a atuação dos municípios na segurança e discute a conjectura segundo a qual o crime organizado pode colaborar para diminuir ou aumentar os homicídios. Há ainda uma breve análise sobre a escassa produção legislativa da bancada da segurança no Congresso - marcada por interesses corporativos - e uma reflexão mais filosófica sobre alguns motivos pelos quais a agenda da segurança pública não avança no país, apesar da existência de alguns diagnósticos e propostas. Em conjunto, discute uma grande variedade de temas relacionados à agenda nacional de segurança e aponta caminhos para ela.
Se na primeira parte discutem-se basicamente temas ligados ao universo da segurança, na segunda parte o autor – que é doutor em ciência política – reflete sobre algumas interpretações e teorias do pensamento político brasileiro, o que também ajuda a iluminar de alguma forma os obstáculos para a reforma da segurança. Merece destaque nesta segunda parte a metodologia de avaliação de riscos políticos sugerida pelo autor, uma espécie de Boletim Focus para a política, tal como existe na economia.
Como de costume em seus trabalhos, o autor não apenas apresenta reflexões instigantes sobre os temas tratados como traz os dados para justificar seus argumentos, além de referências bibliográficas para o aprofundamento das questões. Acredito que esta coletânea de artigos e pesquisas possa dar alguma contribuição ao debate e que é leitura obrigatória para todos os envolvidos neste projeto coletivo.
terça-feira, 14 de agosto de 2018
Presença do PCC e a dinâmica dos homicídios nas Regiões brasileiras
Os dados de homicídios de 2017
acabam de ser publicados no anuário do Fórum Brasileiro de Segurança Pública e
mostram a continuidade de tendências iniciadas na década passada. Se tomarmos,
por exemplo, o período 2007 a 2017, identificamos um forte incremento dos homicídios nos
Estados do Nordeste (60%) e Norte (76%), crescimento moderado no Centro Oeste
(37%), baixo nos estados sulinos (6,5%)
e queda no Sudeste (-11%).
Obviamente que existem casos
discrepantes em cada região. No Nordeste, Estados como Alagoas e Pernambuco
mostram desempenho melhores que a média regional enquanto no Sudeste, Minas
Gerais destoa negativamente dos demais estados. Como entender estas diferentes dinâmicas regionais?
Em 2013 publiquei na Revista do
FBSP um artigo procurando explicar parcialmente o fenômeno.
Resumidamente, no Norte e Nordeste observamos rápido crescimento da renda nas
últimas décadas, que gerou aumento no crime oportunista patrimonial, como o
roubo - além de crescimento desordenado e desigual na periferia das grandes cidades. Este aumento do roubo fez crescer a sensação de insegurança e com ela o
uso da arma de fogo como meio de proteção. Como resultado do aumento das armas
em circulação, vimos simultaneamente o crescimento dos homicídios. Isto num
contexto onde o sistema de Justiça Criminal funcionava já muito precariamente. Em
contraste, no Sudeste principalmente, presenciamos nas últimas duas década um
ciclo virtuoso de crescimento econômico moderado, estabilidade do crime
patrimonial e da sensação de insegurança, diminuição de armas em circulação e
melhorias relevantes na eficiência das polícias, num contexto de diminuição da
população jovem. (Kahn, Crescimento econômico e criminalidade: uma interpretação
da queda dos crimes no Sudeste e aumento no Norte/NordesteRev. bras. segur.
pública | São Paulo v. 7, n. 1, 152-164 Fev/Mar 2013)
Analisando posteriormente os
dados do Atlas da violência no período 2005 a 2015, mostrei dois fenômenos que corroboram a relevância do papel das armas de neste processo: 1) a variação dos homicídios entre 2005 e 2015 acompanha a
variação na proporção de homicídios cometidos com armas de fogo. Em São Paulo
55% das mortes por agressão tem a arma de fogo como instrumento e a média
nacional é de 71,6%. Todo o Nordeste está bem acima destes patamares. Em
Alagoas, a porcentagem é de 87%, 79% na Bahia, 82% no Ceará, 81% na Paraíba,
75% em Pernambuco, 82% no Rio Grande do Norte e em Sergipe 2) as taxas de homicídios
seguem um padrão em formato “U”, isto é, são maiores nas cidades pouco e muito
populosas e menores nas cidades de população média. Não por acaso, a % de homicídios
cometidos com armas de fogo (medindo aqui, simplesmente, armas em circulação),
segue o mesmo formato em U, sugerindo novamente que homicídios, qualquer que
seja a Região do país, seguem de perto a disponibilidade de armas, como
previsto.( https://tuliokahn.blogspot.com/2017/07/por-que-as-taxas-de-homicidios-seguem.html)
Uma explicação alternativa,
bastante comum entre as “autoridades” de segurança pública, argumenta que os homicídios cresceram no Norte
e Nordeste em razão do aumento do tráfico de drogas - especialmente do crack - e dos problemas correlatos que esta modalidade
de crime acarreta: morte entre traficantes por disputas de mercado, morte de
usuários que não pagam suas dívidas, morte de traficantes e usuário em
confronto com as polícias e assim por diante.
Com efeito, droga é uma “mercadoria”
como outras e seu consumo é afetado pelo nível geral da renda. O crescimento
econômico rápido e intenso no Norte e Nordeste nas últimas décadas pode de fato
ter contribuído para o aumento do consumo e apreensão de drogas na Região. Este
aumento do consumo, por sua vez, gerado uma disputa pelo mercado crescente,
endividamento de usuários, confrontos com a polícia, etc. Mas não temos dados,
infelizmente, que corroborem este aumento específico do tráfico e uso de drogas
no Norte e Nordeste, mas apenas os dados dos homicídios, que seriam a “consequência”.
De modo que estamos diante da típica falácia da afirmação do consequente, uma
vez que não existem evidências do aumento do consumo e tráfico especificamente
no período e regiões mais afetadas pela epidemia de homicídios. [1]
Esta explicação não consegue dar
conta de muitas evidências encontradas. As taxas de homicídios, como vimos, são
mais elevadas nas cidades pouco e muito populosas, mas caem nas cidades de
população médias. Vimos que a disponibilidade de armas consegue explicar este
fenômeno. Mas por que motivos o tráfico (e as mortes correspondentes) seria
maior nas cidades pequenas e grandes do que nas médias? Dados das pesquisas da
UNIFESP sobre prevalência de uso do crack, por sua vez, mostram que o uso da
substância é ínfimo no Norte (1%) – onde os homicídios explodiram nos últimos
anos – e elevado no Sudeste (35%), onde os homicídios caíram. (http://g1.globo.com/ciencia-e-saude/noticia/2012/09/nordeste-concentra-40-do-consumo-de-crack-no-brasil-aponta-estudo.html).
As taxas de tráfico por 100 mil habitantes, mesmo que tenham aumentado de forma
generalizada, ainda são bem inferiores à média nacional justamente nos Estados
do Norte e do Nordeste e maiores no Sudeste. Como compatibilizar estes fatos
com a “hipótese das drogas”?[2]
Ligada parcialmente a esta
hipótese do crescimento do tráfico e uso de drogas no Norte e Nordeste, encontramos
agora uma sugestiva explicação da dinâmica dos homicídios nas regiões baseada
na maior ou menor presença do PCC nos Estados. Os pesquisadores Camila Dias e
Bruno Manso estudaram a queda dos homicídios em São Paulo e em suas pesquisas
sugerem que a facção criminosa teve um papel regulador importante para explicar
a queda dos homicídios no Estado. Em trabalho conjunto mais recente, procuram aplicar
aos demais estados uma hipótese semelhante: quanto mais forte a presença do PCC
num estado, maior seu poder regulador sobre os homicídios. Mas a violência num
estado, complementam, pode aumentar durante o processo de consolidação do domínio da facção.
Assim, o impacto da facção criminosa sobre os homicídios dependeria do grau de
presença do PCC no Estado. ( Camila Dias e Bruno Manso. A Guerra: A Ascensão do
PCC e o Mundo do Crime no Brasil)
Se entendi corretamente através
do pouco que foi divulgado pelos jornais (o livro ainda não foi publicado), os
autores basearam-se em evidências policiais e documentos da facção para
classificar os estados segundo a presença do PCC, gerando quatro diferentes
situações: muito alta, alta, média e baixa. Onde a presença do PCC é muito
alta, observaríamos queda nos homicídios. Uma presença média, por outro lado, pode ser indício de disputa com outras facções locais, que pode implicar em aumento da
violência. Uma presença “alta”, supomos, implicaria em algo intermediário entre
o “muito alto” e a “média”, com índices decrescentes de criminalidade. Uma
presença “baixa” por sua vez, implicaria em impactos não significativos sobre a
criminalidade ou em queda, no caso de monopólio de alguma outra facção.
Graficamente, se colocarmos os níveis de presença do PCC num eixo e as taxas de
homicídio no outro, teríamos uma curva logarítmica truncada, como abaixo:
Presença do PCC e impacto sobre
os homicídios
A conjectura faz sentido do ponto
de vista lógico e pode ser colocada à prova empiricamente. Na discussão do caso
paulista, vimos que a conjectura da regulação dos homicídios via PCC falha em
explicar diversas evidências: a queda em São Paulo começa num período anterior,
ocorre de forma generalizada no Estado, mesmo onde não existe a facção, as
mortes caem entre vítimas de todas as idades e gêneros, diminuem as mortes
interpessoais, que guardam pouca conexão com as mortes em dinâmicas criminais,
etc.
(https://www.researchgate.net/publication/305653088_O_Misterio_de_Sao_Paulo''_e_o_Papel_do_PCC_na_Reducao_de_Homicidios_nos_anos_2000). Domínio dentro dos presídios é uma coisa e capacidade de influenciar os
homicídios na sociedade mais ampla é outra. Frente a conjecturas alternativas,
a explicação via regulação do PCC é fraca e residual, impactando eventualmente
a dinâmica criminal de algumas comunidades na Capital. Mas é possível que a conjectura PCC explique melhor a dinâmica dos homicídios em outros estados.
De todo modo, para testar (muito)
apressadamente a hipótese, colocamos na tabela abaixo a classificação dos
autores sobre a presença do PCC nos Estados e as variações nas taxas de
homicídios entre 2007 e 2017.[3]
Antes de aprofundarmos os argumentos, vejamos o que sugerem os dados.
Os estados classificados como de
presença “muito alta” do PCC são SP, PR e MS e todos eles apresentaram queda
nos homicídios na década, corroborando a hipótese dos autores sobre o papel
regulador da facção num contexto monopolista. Nos estados classificados como
presença “alta”, supomos que deveríamos também ver alguma influência deste
poder regulador, embora em menor medida. Mas não é isso que encontramos:
enquanto os homicídios caem ligeiramente em Alagoas, sobem bem acima da média
nacional nos outros quatro (AC, RR, PI e SE). Assim, se é verdade que a
presença do PCC influencia as taxas de homicídio, isto parece ocorrer apenas a
partir de certo estágio de presença, quando ela passa para a categoria “muito
alta” (efeito threshold?).
Uma presença “média” do PCC,
segundo a conjectura, poderia implicar em conflito com outras facções e aumento
da violência. Temos 14 estados neste grupo e dentre estes observamos quedas nos
homicídios no DF e ES no período, que refutam o argumento. Dois outros estados
apresentam variações menores do que a média nacional (RO e PE). Finalmente, em
10 estados vemos crescimentos elevados dos homicídios na década, como sugere a
conjectura.
Por último, temos cinco estados
classificados como de “baixa” presença do PCC e neles a evolução dos homicídios
foi variada: acima da média nos estados da Região Norte (AM, PA, TO), abaixo da
média no MT e queda no RJ - onde várias facções convivem no sistema prisional)
e disputam o mercado de drogas na cidade;
Vemos assim que a evidência é
mista, corroborando as hipóteses em alguns casos e rejeitando em outros. Seria
preciso aprofundar melhor as dinâmicas estaduais para compreender estas possíveis
exceções à regra. Isto supondo que a “regra”
seja válida, algo que ainda não foi razoavelmente demonstrado, como sugere o
caso paulista.
Entre outras questões relevantes,
é possível, baseado em evidência qualitativa, estimar a presença do PCC dentro
das prisões, mas será possível extrapolar esta presença interna para estimar a capacidade
de regular os homicídios nas comunidades, fora das prisões? As quedas ou
aumentos dos homicídios nos estados coincidem temporalmente com os avanços da
presença do PCC? Outras facções monopolistas não deveriam gerar os mesmos
efeitos sobre os homicídios? Como explicar o crescimento dos homicídios
especialmente nas pequenas cidades? Qual o perfil de quem esta morrendo, apenas
homens jovens ligados ao universo do crime? Qual o papel da historicidade, como
políticas públicas específicas de combate aos homicídios adotadas com sucesso em
alguns estados? É preciso que a teoria se adeque a estas características morfológicas
dos homicídios, se tem pretensão a validade.
Como em toda explicação, existem
ainda muitas lacunas a serem preenchidas. A hipótese é criativa e os autores
fizeram mais uma vez um excelente trabalho mapeando a força da facção nos
estados e oferecendo uma explicação coerente para as diferentes dinâmicas
estaduais, superior à hipótese simplista do “crescimento do crack”. Desconfio
novamente que o papel regulador do PCC neste processo de aumentos e quedas, externo
aos presídios, seja novamente residual. Mas as ideias estão (e muito bem)
colocadas e aos pesquisadores resta o desafio de coloca-las ao crivo das
melhores evidências!
[1] O raciocínio
legítimo é se A, então B. Encontramos evidência de A, logo B é corroborado. O raciocínio
falacioso é Se A, então B. Encontramos evidência de B, “logo”, A. É a famosa
falácia da afirmação do consequente.
[2] Estatísticas
de tráfico são tanto um indicador de renda local quanto de atividade policial.
Deste modo, não podemos utiliza-las para estimar o consumo. Precisaríamos de
novas pesquisas de incidência e prevalência para verificar a evolução do
consumo por estado.
[3] A
tabela do FBSP continha lacunas, que foram preenchidas (em vermelho) com os dados de homicídio do Datasus ou
estimadas pelas médias dos anos próximos.
segunda-feira, 30 de julho de 2018
Recessão e roubos: formatos VULW
Se analisarmos as oscilações dos
indicadores econômicos (emprego, PIB, inadimplência, etc.,) durante as recessões,
veremos que os gráficos podem assumir diferentes formatos, aparentando letras alfabéticas
tais como V, U, L ou W.
Resumidamente, o formato em V sugere
uma curta e aguda contração econômica, seguida de recuperação acelerada e igualmente
intensa enquanto a curva em U uma recessão prolongada e moderada. Um gráfico em
L ocorre se a economia passa muitos anos sem crescimento, caracterizando um
tipo mais severo de recessão ou eventualmente uma depressão. A rigor não existe
um "L" de fato pois a definição mesma de ciclo econômico implica que, em algum
momento, a economia volta a crescer. (mas infelizmente não temos nenhuma letra
no alfabeto que represente este retorno, após uma depressão prolongada).
Finalmente, um gráfico em forma de W, caracteriza um movimento do tipo
double-dip (duplo mergulho), quando observamos um curto período de crescimento
econômico após um período recessivo, que por sua vez é sucedido por um novo mergulho.
Todos estes formatos podem ser
vistos também em forma invertida, se estivermos focando nas fases de recuperação do
ciclo, mas para efeitos didáticos vamos nos ater aos principais.
Formatos de ciclos econômicos
V
|
U
|
L
|
W
|
Insistimos já há muitos anos que
os indicadores criminais brasileiros, em especial os patrimoniais, seguem bem
de perto alguns indicadores econômicos do business-cycles, como cheques
devolvidos, expectativa do consumidor, desemprego e Pib, entre outros. Assim, quando analisamos
os gráficos criminais também conseguimos enxergar, frequentemente, estes
diferentes formatos que descrevem os movimentos da economia.
Pelos menos 4 estados (SP, RJ, RS
e MG) publicam dados mensais de criminalidade desde 2002, o que nos permite remontar
a série histórica de modo a abranger as recessões de 2003, 2009 e 2014. No
gráfico abaixo vemos na linha verde as variações dessazonalizadas dos roubos
nestes quatro estados, usando uma média móvel de cinco meses para dar maior
nitidez aos movimentos cíclicos. As colunas azuis, por sua vez, trazem as
variações mensais dos cheques sem fundo devolvidos por milhão de cheques, um
indicador do Serasa que tomamos aqui como medida dos ciclos econômicos.
Como é possível verificar, a
crise econômica de 2003 produziu um pico nos roubos naquele ano, rápido e agudo,
mas logo após a criminalidade retoma a tendência de queda iniciada pouco antes
e que se estende até meados de 2009. Em 2009, a curta recessão gera novo
impacto nos roubos, mas também de breve duração e os roubos retomam a tendência
de queda até metade de 2010. Nos dois momentos de crise, temos algo parecido à
um V invertido no gráfico de variação dos roubos.
A partir de setembro de 2010
observamos uma inversão de tendência nos roubos e um longo período de piora da
criminalidade (cerca de 70 meses, se descontarmos uma breve melhora em 2012),
que atinge seu pico em 2014, no auge da crise econômica. A partir do pico de
2014 note-se, na sequência, um período de 14 meses de recuperação que vai até agosto
de 2015, seguido de um novo crescimento dos roubos até setembro de 2016. De
outubro de 2016 até aproximadamente maio de 2018 presenciamos um novo período de
21 meses de queda nos roubos. Se tomarmos, portanto, este período de 2014 a 2018, é possível ver no gráfico um W em formato invertido (alta 2014 / baixa em 2015 / alta em 2016 / baixa em 2017 a metade de 2018 / nova alta se formando em 2018).
Aparentemente, chegamos ao ponto
máximo do período de queda, o que sugere que a partir daqui veremos uma redução
na velocidade da queda e nos próximos meses um aumento dos roubos. As variações
dos roubos com relação ao mesmo mês do ano anterior em São Paulo, divulgadas
esta semana, foram, a partir de março, de -28, -14, -17 e -2, prenunciando esta
futura inversão. Além disso, note-se como os cheques sem fundo no gráfico também
vem num processo de desaceleração da queda nos últimos meses. Um último indício
é a diminuição nas ocorrências de tráfico de drogas em alguns estados, que
interpretamos como indicador de piora da atividade econômica, pois droga é uma
commodity como outra qualquer e é afetada pelo ciclo econômico. Se este cenário
se configurar, em outubro, durante as eleições, muitos estados estarão passando
por uma fase de crescimento da criminalidade, com eventuais impactos nos discursos
eleitorais.
Neste grande cenário de
incerteza, a única certeza que temos é a de que os ciclos se alternam indefinidamente
e mais cedo ou mais tarde os crimes voltarão a subir. Ajuda muito se a economia
voltar a crescer de forma consistente e não em voos de galinha, que explicam em
parte o formato em W. O discurso de alguns candidatos com relação ao déficit na
previdência e a irresponsabilidade fiscal do Congresso levam a crer que a
economia não voltará a crescer significativamente em 2019. E pode mesmo voltar
a piorar, como a experiência histórica revela.
Este período de inversão de
tendências pode ser um bom teste para verificar os efeitos da intervenção
federal no RJ e outras políticas públicas estaduais. Quem continuará o movimento
de queda na criminalidade dos últimos meses, quando os ventos soprarem contra?
segunda-feira, 16 de julho de 2018
Cinco meses de Intervenção Federal no RJ: no fogo cruzado das interpretações
Em dois artigos anteriores neste
ano abordamos o tema do impacto da intervenção federal na segurança pública do
Rio de Janeiro, utilizando como fonte os dados oficiais publicados pelo ISP-RJ.
De um modo geral, a conclusão foi de que a maioria dos indicadores estavam em
queda ou estabilizados. A queda, todavia, começara num período anterior à
intervenção e seguia uma tendência generalizada de diminuição criminal nos
Estados, depois de passado o pior momento da recessão de 2014.
A magnitude da queda Carioca,
quando comparada aos demais estados, não chega a ser surpreendente, de modo que
não se pode atribuí-la, necessariamente à intervenção federal, sendo necessário
dados locais das ações para aferir a existência de eventuais impactos.
As pesquisas de opinião
realizadas no RJ sugerem que a população apoia a intervenção, mas que esta
enfrenta bastante resistência em diversos setores sociais, dada a natureza
militar da intervenção e a pouca transparência com relação a metas e meios para
atingi-los. O assassinato da vereadora Marielle Franco e a morte de civis - muitas
crianças – em operações desastradas aumentaram a polarização na sociedade
carioca em relação à intervenção.
Este duelo de versões e
interpretações sobre o que está ocorrendo com a criminalidade após a
intervenção se reflete no uso das estatísticas criminais e, através desta, na
cobertura jornalista sobre o cenário. Enquanto o governo esgrima os dados
oficiais – principalmente de roubo de veículos e de carga – para mostrar que a
criminalidade está em queda e que a responsabilidade é da nova gestão, a
sociedade civil utiliza os dados da plataforma “Fogo Cruzado”, para mostrar
outros aspectos indesejados da intervenção federal.
Como descrito no site da
Instituição, Fogo Cruzado é uma plataforma digital colaborativa que registra denúncias
de tiroteios e violência armada na região metropolitana do Rio. A base de dados
é formada pelas denúncias recebidas pelas redes sociais ou noticiadas pelos meios
de comunicação e é possível acompanhar a evolução dos tiroteios desde julho de
2016. Enquanto os jornais dão bastante destaque aos dados da plataforma, o
governo evita comentá-los, alegando que se tratam de dados não oficiais.
Como mencionado em artigo
anterior, é necessário algum cuidado na utilização dos dados do Fogo Cruzado
pois assim como os dados oficiais, as denúncias variam conforme a propensão à
notificação: a própria intervenção e o uso dos dados da plataforma para avalia-la
pode assim inflacionar a quantidade de denúncias recebidas.
Na tabela abaixo compilei os
dados mensais de tiroteios, presença de agentes públicos no local dos
tiroteios, contagem de mortos e feridos nos eventos, segundo as denúncias
recebidas pelo Fogo Cruzado, de julho de 2016 a junho de 2018.
Acrescentei à tabela quatro
colunas: razão entre mortos e feridos nos tiroteios e as razões entre tiroteios
por agente, mortos por agente e feridos por agente policial presente. Estas
razões são classicamente utilizadas para aferir eventuais excessos nas ações
policiais pela literatura.
Ao final da tabela inclui também
as médias de três períodos: 1) fevereiro a junho de 2017, 2) cinco meses
anteriores à intervenção e 3) média dos cinco meses após, ou seja, fevereiro a
junho de 2018, possibilitando uma comparação dessazonalizada com a primeira
média.
Fonte: plataforma Fogo Cruzado
Os primeiros dados interessantes
surgem nas “razões” destacadas em cores: nos meses anteriores à intervenção
observamos um aumento em todas elas, quando a razão é superior a 1. Assim, por
exemplo, quando analisamos a série histórica de mortos por feridos, há um crescimento
de 41% na comparação com o mesmo período do ano anterior, mas uma certa
estabilidade quando comparamos com as médias dos cinco meses anteriores à
intervenção (apenas 2% de aumento). Observe-se pelos “vermelhos” na tabela que
o pior período, analisando todos os indicadores, parece ter ocorrido entre
julho e dezembro de 2017, e a partir daí observamos alguma melhora relativa.
Há um evidente aumento no número
de denúncias de tiroteio após a intervenção federal (69% ou 40%, dependendo do
período base que se utilize), assim como da presença de agentes nos locais (82%
e 126%). Algo esperado, tendo em vista tanto o aumento na quantidade de
operações quanto da sensibilização da população com relação ao tema.
Note-se, contudo, que a
letalidade das ações parece diminuir, tanto em números absolutos quanto relativos,
quando utilizamos as razões por agente. Usando a comparação dessazonalizada, o
número absoluto de feridos cai 23% enquanto o de mortos cresce 5%. Usando a
comparação com os meses anteriores, o número de feridos cai 10% e o de mortos
8%.
E, na medida em que houve um
aumento da presença de policiais nos eventos, qualquer que seja o período base de
comparação, notamos uma diminuição nos indicadores “tiroteios por agente”, “mortos
por agente” e “feridos por agente”.
Seria interessante analisar os
dados oficiais de letalidade para verificar se eles apontam para a mesma
tendência, mas os dados de letalidade de junho ainda não foram publicados e não
existem dados sobre feridos ou quantidade de policiais presentes nas ações. De
todo modo, tomando apenas os homicídios decorrentes de intervenção policial
publicados pelo ISP, observamos um crescimento no indicador quando comparamos a
série dessazonalizada (média de 96 X 113) e estabilidade quando comparamos com os cinco meses anteriores à intervenção (114 X 113).
Como já manifestado
anteriormente, há várias razões de diferentes naturezas para se criticar a intervenção,
mas isto não quer dizer que nossa análise factual sobre seu impacto nos
indicadores deva ser afetada. É preciso observar os dados com cuidado e
proceder “sine ira et studio”, como recomendava Weber, mesmo contra nossas
convicções íntimas. Do contrário, nossa capacidade de crítica isenta é a primeira
vítima neste fogo cruzado.
quinta-feira, 12 de julho de 2018
Homicídio ou homicídios? diferentes explicações para diferentes contextos nacionais
Em junho publicamos um artigo
correlacionando a taxa de homicídios coletada pela UNODC com centenas de
indicadores sócio econômicos disponibilizados pelo Banco Mundial, para 217
países em todo o mundo. Nas correlações bivariadas, diversos indicadores se
revelaram significativos para explicar porque alguns países tinham taxas
maiores ou menores de homicídio.
Mas tomar países abstratamente como
unidade de análise pode ser enganoso, uma vez que escondem realidades bastante
diferentes. Se as diferenças de contexto são grandes quando comparamos cidades
ou estados de um mesmo país, são ainda maiores quando comparamos países.
Um é paupérrimo e outro
riquíssimo. Um muçulmano e outro católico. Este tem grande população jovem e
poucos migrantes e o vizinho o contrário. Um é pequeno e gelado a maior parte
do ano e outro enorme e desértico. Num a população se concentra em alguns
pequenos centros urbanos enquanto noutro se espalha pelos campos. A economia de
um é diversificada e equilibrada e a de outro se baseia na exportação de alguns
poucos produtos primários. Em resumo, as diferenças em nível internacional são
muito mais acentuadas do que em nível mais local e estas diferenças afetam os
níveis de criminalidade.
Em tese esta variabilidade é
positiva, pois faz com que nossas variáveis variem!!! Assim, por exemplo, a
relação entre homicídios e concentração de renda fica muito mais nítida quando
incluímos na amostra países com níveis de homicídio altos e baixos e
concentração de renda variada. Por outro lado, como veremos adiante, uma
diferença acentuada de contextos pode ser enganadora: a relação entre homicídio
e a variável X parece forte, mas apenas porque é especialmente forte numa
determinada região, todavia fraca nas demais. Ou a relação entre homicídios e a
variável Y parece inexistente, mas na verdade tem sinal positivo na região A e
negativo na região B, fazendo com que se anulem. Este é um problema de muitas
pesquisas quantitativas: as variáveis devem variar, mas o ideal é que a
distribuição do fenômeno seja mais ou menos aleatória entre as unidades de
análise.
No caso dos crimes e diversos
outros fenômenos sociais, não é sempre o que acontece. Crime tem padrões
universais, mas também diversas características e especificidades locais. Isso
faz com que algumas variáveis sejam relevantes numa região do planeta e
irrelevantes em outras. Importantes para países com grau de desenvolvimento
econômico elevado e desimportante em países pobres.
Na analise a seguir, tomamos
novamente as taxas de homicídios da UNODC como variável a ser explicada e
correlacionamos com as mais de 1500 variáveis sócio econômicas do projeto WDI
(World Development Indicators) do Banco Mundial, mas desta feita desagregamos os
países por região (África, América, Europa, Ásia e Oceania) e grupo de renda
per capita.
Obviamente que internamente estas
regiões também são bastante heterogêneas: dentro da América temos os Estados
Unidos e Honduras. Seria possível trabalhar com sub-regiões mais homogêneas,
mas o problema é que a quantidade de países não é grande suficiente para
suportar subdivisões menores e a regra de etiqueta é que se evite interpretar
estatísticas calculadas com número de casos demasiado baixo (o que explica a
exclusão da Oceania das regiões).
Dividimos também os países em
dois grupos de renda: um primeiro com 64 países com renda per capita mais
elevada e os demais num segundo grupo. Aqui também cabe observar que nível de
renda per capita não é garantia de homogeneidade. Convivem no grupo de renda
elevada países nórdicos igualitários e países árabes exportadores de petróleo,
onde a riqueza se concentra na família real e seus apaniguados. Nos dois casos
– região e grupo de renda – trata-se apenas de garantir uma maior
homogeneidade, quando comparado com a amostra global, mas ainda assim temos
bastante heterogeneidade interna nas regiões e grupos de renda.
A questão relevante é: quando
analisamos as correlações entre as taxas de homicídios e as centenas de
indicadores socioeconômicos do WDI, encontramos variáveis que se mostram
relevantes globalmente para explicar a variação na taxa de homicídio dos países?
Ou seja, algo que seja válido para todos os países, independente da região ou
nível de renda per capita? Por outro lado, que indicadores se revelam
especificamente relevantes dentro de cada região ou grupo de renda?
Um primeiro resultado da análise
é que aparentemente existem poucas variáveis que sejam relevantes universalmente.
A maioria delas se revelou válida apenas para algumas regiões ou apenas para um
grupo de renda. Em parte, este pode ser o resultado da redução do tamanho da
amostra, quando dividimos os países por região ou em dois grupos de renda. Mas
pode significar também que o homicídio tem padrões que são regionais ou
características específicas, dependendo do nível de renda nacional.
Assim, por exemplo, quando
dividimos os países entre renda per capita alta e baixa, observamos que para os
países de renda elevada são importantes para “explicar” as variações nas taxas
de homicídios as variáveis relacionadas a educação, inflação e tarifas sobre os
produtos, enquanto para os países de renda mais baixa, são mais relevantes as
variáveis relacionadas a concentração de renda, trabalho infantil e pobreza. Ou
seja, são variáveis diferentes que parecem explicar as taxas de homicídios nos
países de renda per capita alta e baixa. Isso sugere que podem coexistir
diferentes dinâmicas por trás do fenômeno que denominamos genericamente por
“homicídio”. E que o que importa num determinado patamar de renda não se aplica
necessariamente ao outro.
A tabela abaixo traz o coeficiente
t significativos e resume os tipos de indicadores que são mais relevantes para
cada grupo de países. Exceto por um indicador, todos os demais são não
coincidentes.
Tabela 1 – Associações
significativas (t) entre taxas de homicídios e indicadores socioeconômicos,
segundo grupo de renda do país
Fonte: taxas de homicídio (UNODC)
/ indicadores socioeconômicos World Bank, projeto WDI
O mesmo acontece quando dividimos
os países por regiões: na África, explicam melhor as variações nas taxas de
homicídio os indicadores de concentração de renda, o peso da dívida externa e
os indicadores de desemprego. Na América, parecem mais relevantes as variáveis
ligadas à educação. Na Ásia os indicadores demográficos, educacionais, de
qualidade logística do país e de renda são os que mais fortemente se vinculam
aos homicídios. Na Europa, finalmente, vemos um “mix” amplo de indicadores
relacionados à demografia, educação, inflação, logística, emissão de poluentes,
variáveis ligadas à saúde e porcentagem de tarifas sobre os produtos. Mais uma
vez aqui, percebe-se que indicadores diferentes são relevantes em diferentes
regiões (embora Ásia e Europa compartilhem muitos indicadores)
Estamos diante de artifícios
estatísticos ou de fenômenos reais? Como discutimos no primeiro artigo, estas
são apenas correlação bivariadas simples e são necessários modelos mais
robustos para testar estas hipóteses. É possível que variáveis do tipo
“tarifas”, “logística”, “emissão de poluentes”, etc. – que vimos estarem
relacionadas aos homicídios nos países de maior renda - sejam apenas medidas
indiretas do “grau de pobreza” e “concentração de renda” e que apenas por acaso
apresentem coeficientes mais fortes do que “pobreza urbana” ou “participação na
renda”, que se relevaram significativas nos países mais pobres.
De todo modo, nosso objetivo não
é aprofundar modelos mas antes o de resumir cerca de 6 mil equações (por ex,
correlação entre os 1500 indicadores X 4 regiões). E não deixa de ser
interessante observar nesta análise exploratória que, quando dividimos os países
em grupos, as taxas de homicídio parecem ser explicadas por conjuntos
diferentes de indicadores, sugerindo a existência de diferentes dinâmicas de
homicídios. A literatura criminológica já revelou que existem diversas
dinâmicas sociais por traz dos homicídios: em alguns locais apresentam natureza
mais passional e em outro estão mais ligados a dinâmica propriamente criminal.
Num contexto temos influencia do crime organizado e das organizações policiais
ou paramilitares e num outro os efeitos da disponibilidade de álcool, drogas e
outros fatores crimogenicos. Sabemos, portanto, que o fenômeno “homicídio” pode
ser bastante heterogêneo em si.
É importante levarmos em conta
estas especificidades na formulação de políticas públicas. Não existem fórmulas
universais, embora saibamos já que alguns conjuntos de variáveis e políticas
públicas tendem a diminuir os homicídios e outros a aumentá-los. Mas o que
funcionou num contexto pode não funcionar, ou ter um impacto menor, num
contexto diverso. O caso do Estatuto do Desarmamento no Brasil e seu impacto desigual
nas regiões é um claro exemplo desta diferença de contextos, como já tratamos
em outra ocasião.
Novamente aqui fica o alerta para
a necessidade de aprofundarmos o estudo do fenômeno antes de intervirmos
através de políticas públicas. Há muito mais entre o céu e a terra do que podemos
supor observando apenas as taxas de homicídio.
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