Introdução
Com as eleições presidenciais de 2026 no horizonte, cresce o interesse em compreender quais candidatos têm maiores chances de chegar competitivos ao segundo turno. Pesquisas de intenção de voto e indicadores de popularidade oferecem pistas, mas nem sempre captam o elemento mais decisivo de uma eleição: a coordenação estratégica dos eleitores.
Em disputas polarizadas, os eleitores não escolhem apenas com base em preferências pessoais; eles também consideram quem tem chances reais de vencer. Essa interação — em que cada voto depende das expectativas sobre o comportamento dos demais — pode ser formalizada como um jogo de coordenação, no qual a viabilidade eleitoral torna-se um fator tão importante quanto o carisma ou as propostas de um candidato.
Para estudar esse fenômeno, aplicamos um modelo baseado na Teoria dos Jogos, o chamado Equilíbrio de Resposta Quantal (QRE), calibrado com dados empíricos das eleições de 2018 e 2024. O objetivo é prever a distribuição de apoio entre os principais candidatos de 2026, levando em conta não apenas a intenção de voto bruta, mas também a rejeição, o potencial de voto e o comportamento estratégico dos eleitores.
Metodologia: o jogo de coordenação eleitoral
O modelo parte de três variáveis centrais obtidas em pesquisas de opinião:
-
Potencial de voto (PV) — soma de quem “votaria com certeza” e quem “poderia votar” em determinado candidato;
-
Rejeição (RJ) — percentual que afirma “não votaria de jeito nenhum”;
-
Viabilidade percebida (S) — fração estimada de eleitores que, observando as pesquisas, julgam que o candidato tem chances reais de vitória.
Essas variáveis são combinadas na seguinte expressão de utilidade individual:
[
U_i = \alpha \cdot PV_i - \beta \cdot RJ_i + \gamma \cdot S_i
]
onde α, β e γ representam, respectivamente, os pesos do potencial de voto, da rejeição e da percepção de viabilidade.
A partir daí, os eleitores escolhem probabilisticamente entre os candidatos — isto é, quanto maior a utilidade de um nome, maior a probabilidade de ser escolhido, mas nunca de forma determinística. Essa “resposta imperfeita” é controlada por um parâmetro τ, que define o quanto o comportamento coletivo é rígido ou difuso.
O processo é iterado diversas vezes até que o sistema alcance um equilíbrio estável, onde nenhum candidato ganha ou perde apoio sem que o comportamento dos outros também mude. Esse ponto de equilíbrio — o Equilíbrio Quantal (QRE) — reflete a composição final esperada do eleitorado em um ambiente estratégico.
Calibração empírica
O modelo foi calibrado a partir de duas eleições recentes com ampla base de dados:
-
São Paulo (2024), com seis principais candidatos à prefeitura (Real Time Big Data);
-
Brasil (2018), sem Lula, usando pesquisa DataPoder360 e resultados oficiais do TSE.
A calibração ajustou os parâmetros para minimizar o erro médio absoluto (MAE) entre os resultados previstos e os votos reais. O conjunto ótimo encontrado foi:
[
\alpha = 0{,}8,\quad \beta = 0{,}4,\quad \gamma = 0{,}2,\quad \tau = 15
]
Esses valores sugerem que o eleitor médio atribui o dobro de peso ao potencial de voto em relação à rejeição, e reage moderadamente à percepção de viabilidade. O alto valor de τ indica um eleitorado diversificado, com múltiplos polos de preferência, e não um comportamento “tudo ou nada”.
Resultados: o equilíbrio eleitoral de 2026
Aplicando o modelo calibrado às pesquisas mais recentes (setembro–outubro de 2025), os resultados indicam o seguinte equilíbrio entre os sete principais nomes:
Candidato | Potencial de Voto | Rejeição | Participação Estimada (QRE) |
---|---|---|---|
Lula (PT) | 44% | 49% | 27,6% |
Ratinho Jr. (PSD) | 36% | 41% | 20,2% |
Tarcísio de Freitas (Republicanos) | 35% | 45% | 16,3% |
Michelle Bolsonaro (PL) | 33% | 53% | 11,0% |
Romeu Zema (Novo) | 28% | 50% | 8,9% |
Ronaldo Caiado (União) | 27% | 48% | 8,1% |
Simone Tebet (MDB) | 25% | 52% | 7,2% |
O equilíbrio mostra que Lula ainda lidera, mas com margem reduzida e vulnerabilidade caso a oposição consiga unificar apoios em torno de um nome de centro-direita.
Por que Ratinho Jr. aparece competitivo
O desempenho de Ratinho Jr. no modelo se explica por três fatores combinados:
-
Baixa rejeição relativa (41%) — em comparação com figuras de maior polarização, como Lula ou Michelle Bolsonaro;
-
Imagem neutra e pragmática, associada à boa gestão estadual no Paraná;
-
Capacidade de herdar votos da direita sem afastar eleitores moderados — algo que Tarcísio ou Michelle dificilmente conseguiriam devido à associação direta com o bolsonarismo.
No jogo estratégico, isso significa que Ratinho Jr. é o “ponto focal” da coordenação opositora: ele maximiza a utilidade dos eleitores que desejam uma alternativa ao PT, mas sem risco de radicalização. À medida que a disputa se aproxima e os eleitores percebem sua viabilidade, o modelo prevê uma migração gradual de votos em sua direção, semelhante ao fenômeno observado com Marina Silva em 2010 ou com Bolsonaro em 2018.
Interpretação e implicações
O modelo não prevê resultados definitivos, mas indica direções prováveis de coordenação política. Ele mostra que:
-
A liderança de Lula depende fortemente da fragmentação do campo opositor;
-
Se houver convergência de centro e direita em torno de um único nome, esse candidato se torna competitivo já no primeiro turno;
-
A rejeição é o fator mais limitante para os líderes conhecidos, enquanto o potencial de voto latente beneficia figuras novas ou de perfil técnico.
Ratinho Jr. se encaixa exatamente nessa categoria: conhecido o bastante para ser viável, mas ainda neutro o suficiente para crescer.
Conclusão
O exercício mostra o poder da teoria dos jogos para analisar eleições em cenários fragmentados. Em vez de assumir que o eleitor decide de forma isolada, o modelo reconhece que votar é um ato coletivo, sensível às expectativas sobre o comportamento dos outros.
Nesse contexto, a eleição de 2026 pode ser vista como um jogo de coordenação entre dois blocos: o do governo, liderado por Lula, e o da oposição, que busca um ponto de equilíbrio entre identidade e moderação.
Se as pesquisas confirmarem a tendência de queda na rejeição de Ratinho Jr. e estagnação dos candidatos mais ideológicos, o governador do Paraná tem caminho aberto para se tornar o adversário natural do presidente na disputa presidencial.