Faltando menos de um ano para as eleições presidenciais de 2026, o Brasil começa a viver um déjà-vu político: o mesmo clima de incerteza e polarização, mas com novos protagonistas. O presidente Luiz Inácio Lula da Silva tenta manter a coesão de sua base em meio a uma aprovação dividida, enquanto o governador do Paraná, Ratinho Júnior, emerge como alternativa de centro-direita moderada. Do outro lado, sem Jair Bolsonaro na disputa — após condenação e inelegibilidade —, a direita tenta se reorganizar em torno de um novo nome da família: Michelle Bolsonaro ou Eduardo Bolsonaro, herdeiros políticos do bolsonarismo.
Por trás das manchetes, analistas políticos e estatísticos recorrem a modelos de predição eleitoral cada vez mais sofisticados. Essas ferramentas matemáticas — que unem economia, sociologia e ciência de dados — permitem transformar os números das pesquisas e os indicadores econômicos em probabilidades de vitória. E, segundo os cálculos, a eleição de 2026 promete ser uma das mais equilibradas desde a redemocratização.
A ciência das previsões eleitorais
Os modelos de previsão não se baseiam em intuição, mas em regressões logísticas, conhecidas como modelos logit. Eles estimam a chance de vitória de um candidato incumbente a partir de quatro variáveis-chave:
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Aprovação líquida do governo — a diferença entre aprovação e desaprovação do presidente;
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Crescimento do PIB — reflexo direto do desempenho econômico percebido pelo eleitor;
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Fadiga política — o desgaste natural de partidos que permanecem muito tempo no poder;
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Competitividade eleitoral — uma medida derivada das pesquisas, que combina o potencial de voto com o nível de rejeição.
Historicamente, a aprovação líquida é o fator mais decisivo. Estudos comparando eleições brasileiras desde 1989 mostram que cada ponto percentual adicional de aprovação líquida aumenta em cerca de 8% as chances de reeleição. O crescimento econômico, por sua vez, tende a impulsionar o incumbente, mas de forma mais modesta — aproximadamente 0,4 ponto percentual de probabilidade por ponto de PIB.
Lula: estabilidade, mas fadiga
Segundo a pesquisa Genial/Quaest de outubro de 2025, 48% dos brasileiros aprovam e 49% desaprovam o governo, o que coloca a aprovação líquida em –1 ponto. A economia, embora estável, não empolga: a Moody’s projeta PIB de 1,8% em 2026, uma taxa positiva, mas insuficiente para gerar sensação de prosperidade.
Com esses números, os modelos de previsão estimam probabilidade de reeleição em torno de 30%, quando ajustados pelo “fator fadiga” — afinal, Lula já governou o país por dois mandatos entre 2003 e 2010. Na métrica da competitividade eleitoral, que combina potencial de voto e rejeição, o petista marca 0,53, sustentado por base consolidada, mas limitado por rejeição de 46%.
Ratinho Júnior: o outsider competitivo
Entre os novos nomes, Ratinho Júnior (PSD) é o que mais cresce nas sondagens e nos modelos estruturais. Seu Índice de Competitividade Eleitoral (IC) é de 0,57, ligeiramente superior ao de Lula. Ele combina imagem de gestor pragmático, discurso moderado e rejeição relativamente baixa (34%).
Quando o modelo logit incorpora essa vantagem de competitividade, a probabilidade de vitória do governador paranaense sobe de 10% para cerca de 19% — um salto expressivo para um candidato ainda fora do noticiário nacional. Em cenários simulados, ele perde para Lula por margens de 5 a 7 pontos percentuais, mas mostra espaço para crescimento caso o humor econômico piore.
A direita órfã: Michelle e Eduardo Bolsonaro testam o legado
A inelegibilidade de Jair Bolsonaro reconfigura o campo conservador. Sua ausência abre um vácuo que pode ser ocupado por dois nomes: Michelle Bolsonaro, que desponta como símbolo de continuidade emocional do bolsonarismo, e Eduardo Bolsonaro, deputado e herdeiro político mais ativo do clã.
Segundo dados da Quaest de setembro de 2025, Michelle tem 25% de eleitores que “com certeza votariam” nela e outros 25% que “poderiam votar”, mas também 41% de rejeição e 9% de desconhecimento — resultando em um IC de 0,50, abaixo tanto de Lula quanto de Ratinho. Eduardo aparece com IC de 0,43, refletindo rejeição alta e um teto eleitoral menor.
Nos modelos de simulação, ambos teriam probabilidade entre 10% e 15% de vitória em um segundo turno contra Lula, o que os coloca atrás de Ratinho em competitividade, embora com base fiel e orgânica.
O jogo dos cenários
A modelagem também permite testar diferentes condições políticas e econômicas. Se a aprovação líquida do governo cair para –5 pontos, a probabilidade de Ratinho vencer sobe para cerca de 26%, e a de um candidato bolsonarista puro (como Michelle) para 18%.
Por outro lado, se o governo encerrar 2025 com aprovação líquida positiva (+5 pontos) e inflação controlada, Lula ultrapassaria 60% de chance de vitória, praticamente consolidando sua liderança.
Gráficos de simulação revelam que a probabilidade de vitória de Lula cai acentuadamente com piora na avaliação do governo e se estabiliza quando a aprovação líquida está acima de zero. O que se desenha é um equilíbrio dinâmico: cada ponto de confiança ou decepção na economia pode decidir o futuro político do país.
A eleição da incerteza
A presença simultânea de Lula, Ratinho Júnior e um nome da família Bolsonaro em 2026 compõe um quadro inédito. De um lado, o presidente representa a experiência e o capital político acumulado; do outro, Ratinho simboliza a tecnocracia regional e a transição para uma direita menos ideológica; e, à direita, Michelle ou Eduardo encarnam a resistência emocional ao lulismo e a fidelidade de uma base que permanece mobilizada.
Os modelos estatísticos indicam que Lula segue favorito, mas não invulnerável. Ratinho aparece como o adversário estruturalmente mais perigoso, e um candidato bolsonarista, embora limitado pela rejeição, mantém a capacidade de forçar um segundo turno competitivo.
Se a política é uma arte movida por emoções, a predição eleitoral tenta transformá-la em ciência — mas nem a matemática é capaz de capturar todas as surpresas brasileiras. Em 2026, a disputa será também entre equações: uma equação econômica de estabilidade e uma equação política de mudança. O resultado, como sempre, dependerá de qual delas o eleitor decidir resolver primeiro.