quinta-feira, 18 de agosto de 2022

Presença nas redes sociais determina intenção de voto?

 


 

Não existe consenso sobre o impacto que a presença dos candidatos nas redes sociais tem sobre as eleições. Trata-se de um fenômeno relativamente recente e pouco estudado. No Brasil, o uso das redes sociais de forma massiva durante as eleições ocorreu mais intensamente a partir das eleições de 2018, quando Bolsonaro, disputando por um pequeno partido e com poucos recursos, venceu as eleições presidenciais. Argumenta-se que a campanha pelas redes teve papel relevante nas campanhas de Obama e Trump, mas é difícil isolar especificamente o papel das redes nestes resultados.

Nas últimas eleições presidenciais, analistas atribuíram parte do bom desempenho de Bolsonaro ao engajamento do candidato nas redes sociais, quando inclusive foi acusado de práticas ilegais como disparo em massa de mensagens pelo WhatsApp e disseminação de fake news, práticas objeto de investigações pela justiça. As práticas abusivas durante as campanhas passaram a ser mais bem controladas pelo TSE e pelas próprias empresas nas eleições subsequentes, embora ainda seja grande a quantidade de informações enganosas que circulam pelas redes.

O Estadão lançou recentemente uma ferramenta onde é possível acompanhar o tamanho, crescimento e engajamento dos candidatos presidenciais nas principais redes – com exceção do Tik Tok, última moda entre os jovens. Por outro lado, os agregadores de pesquisas eleitorais nos dão uma boa noção do potencial de voto em cada candidato. A questão interessante que se coloca é saber se e em que medida a presença nas redes tem de fato se traduzido em intenção de votos para os candidatos.

A tabela abaixo traz o número de seguidores dos quatro principais candidatos à presidência. Em conjunto, os candidatos mobilizam quase 63 milhões de pessoas, o que equivale a aproximadamente 40% do eleitorado brasileiro, estimado em 156 milhões. (o cálculo não é exato, pois há seguidores nas redes que não são eleitores). Bolsonaro tem 47 milhões de seguidores, o equivalente a 30% do eleitorado. Lula, em comparação, tem “apenas” 10 milhões de seguidores, o equivalente a cerca de 7% dos eleitores. Ciro tem pouco mais de 4 milhões e Simone Tebet não chega aos 700 mil seguidores.

 

Candidato

Facebook

Twiter

Instagram

Youtube

total

% eleitores

Bolsonaro

14604896

8553027

20397946

3740000

47295869

30.2%

Lula

499461

3973664

5622670

513000

10608795

6.8%

Ciro

974162

1434985

1281373

480000

4170520

2.7%

Tebet

160582

334024

179973

8960

683539

0.4%

 

16239101

14295700

27481962

4741960

62758723

40.1%

 

 

Número de seguidores não é a única métrica relevante, pois há que se levar em conta a intensidade do engajamento e o uso de outros sistemas como o WhatsApp ou Telegram, que são ferramentas de comunicação mas também bastante utilizadas no Brasil para a transmissão de informações sobre política. De todo modo, podemos supor que o número de seguidores reflita de algum modo a presença dos candidatos nas redes.

Bolsonaro tem a maior parte dos seguidores no Instagram (43%) e no FaceBook (30,9%) enquanto Lula concentra seus seguidores no Instagram (53%) e Twitter (37,5%), assim como Ciro Gomes (34,4%). É digno de nota que apenas 4,7% dos seguidores do petista venham do Facebook. Tebet tem praticamente metade dos seus seguidores no Twitter(48,9%), que de todas é a mais politizada e que mais “viraliza” conteúdos. Embora todos tenham presença, o Youtube é a plataforma menos utilizada pelos candidatos para angariar seguidores.

Quem acompanha as pesquisas de intenção de voto percebe a primeira vista que número de seguidores não se traduz necessariamente em capital eleitoral. Tomando os dados do agregador de votos do Estadão desta primeira quinzena de agosto, vemos Lula com 45% das intenções de voto, seguido por Bolsonaro com 32%, Ciro Gomes com 7% e finalmente, Tebet com 2% das menções.

No caso de Bolsonaro há algum equilíbrio relativo entre presença na rede e intenção de voto: o presidente se comunica com 30% do eleitorado nas redes sociais e obtém 32% das intenções de voto. Ciro e Tebet, por outro lado, tem claramente mais eleitores do que seguidores nas redes.  A maior distorção, todavia, aparece no caso de Lula, que tem aproximadamente 6,6 vezes mais eleitores do que seguidores nas redes. Visto de outro modo, Lula se comunica nas redes com apenas 15% do seu eleitorado, estimado em 70 milhões de pessoas.

O capital político do ex-presidente, um político tradicional e analógico, digamos assim, está em grande parte fora das redes sociais, ainda na memória dos eleitores – a grande maioria dos quais não se interessa em acompanhar ou interagir com seu candidato. O perfil de renda, escolaridade, regional e demográfico dos eleitores de cada candidato também impacta na maior ou menor presença nas redes e explica parte destas diferenças de estilo das candidaturas: mulheres nordestinas de baixa renda e escolaridade tendem a votar em Lula, mas é improvável que acompanhem o candidato nas redes sociais.

Políticos bem conhecidos e bem avaliados, portanto, podem ainda “compensar” uma reduzida presença nas redes com seu “capital político” tradicional: organização partidária, ramificação municipal, carisma, recursos econômicos, tempo de TV, militância, etc. Existem assim diversos outros tipos de recursos que podem contrabalançar o uso das redes, onde em geral os candidatos falam para seus próprios convertidos. E o contexto macro-político e econômico muda a cada eleição, favorecendo ou desfavorecendo representantes do governo ou da oposição. Em resumo, existem dezenas de outras variáveis que explicam e determinam a intenção de voto, para além da presença nas redes. Seu peso pode ser mais decisivo em eleições proporcionais, onde muitos candidatos desconhecidos disputam a atenção dos eleitores.

A campanha eleitoral acaba de começar oficialmente e é preciso aguardar para ver o impacto do uso das redes pelos candidatos nas intenções de voto. As pesquisas eleitorais mostram que as preferências dos eleitores já estão bastante consolidadas e a campanha será curta. Há muito mais controle também sobre o uso das redes nas eleições. Embora Bolsonaro leve vantagem sobre Lula neste quesito, tudo leva a crer que dificilmente a presença nas redes terá o potencial, por si só, de alterar o cenário eleitoral atual.

 

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