quinta-feira, 29 de setembro de 2016

O que propõem (e o que não propõem) os programas de segurança dos candidatos a prefeito em São Paulo.


Através do site do TSE é possível acessar os programas de todos os candidatos a prefeito nas eleições de 2016. São literalmente milhares de programas disponibilizados e um excelente material para investigar como a questão da segurança pública vem sendo tratada no âmbito municipal.

Infelizmente não há como investigar os milhares de programas municipais. Neste artigo analisamos somente as propostas de segurança dos principais candidatos a prefeito em São Paulo, que são reveladoras tanto pelo que propõem quanto pelo que omitem. Localizamos 85 propostas nos sete programas, embora 5 delas sejam antes princípios gerais do que propostas.

Antes de detalhar as sugestões, daremos uma olhada panorâmica nos termos mais utilizados nos programas, através da construção de uma nuvem de palavras. O tamanho da palavra na nuvem dá uma dimensão da relevância do termo dentro do discurso e é uma maneira de identificar conceitos e categorias de destaque nos programas de segurança.




A tabela abaixo traz os 45 termos mais frequentes nos programas de segurança, organizados pelo número de menções, e nos fornece uma boa ideia do teor do debate. Alguns termos são óbvios, como “segurança” ou “pública”, mas outros nem tanto. Destaco na tabela aqueles termos que me pareceram mais significativos, como “guarda”, “integração”, “prevenção”, “drogas”, “planejamento”, “sistemas”, “polícia”, “parceria”, “cultura”, “cidadã”, “iluminação”, “paz”, “mulheres”, “formação”, “escolas” e “conselhos”.

37
Segurança
9
Urbana / urbanização / urbano
6
Promover
30
Pública / públicas / público
9
sistema / sistemas
6
Paz
27
Guarda / GCM / guardas
9
políca / policiamento / políciais
6
município
21
programa / programas
9
Metropolitana
6
Mulheres
20
integração / integrada / integral / integrando
9
governo / governos
6
maior
18
Violência
9
Ampliar
6
insegurança
16
Civil
8
parceria / parceiros / parceira
6
Formação
14
Municipal / municipais
8
Fortalecer / fortalecimento
6
Federal
12
prevenção / preventivas
8
Cultura / culturais
6
escolar / escolas
12
política / políticas
8
Cidadã
6
Criar
12
dependentes / drogas
7
População
6
Conselhos
12
Cidade
7
iluminação / iluminadas
6
combate
10
planejamento / planejar / plano
7
Áreas
6
atendimento
10
Paulo
6
Uso
6
agentes
10
ação / ações
6
sociais / social
5
regiões / região

Lendo a tabela de outro modo, poderíamos dizer que os programas dos candidatos, em linhas gerais, pretendem: [ampliar; promover; criar; fortalecer; combater] os [programas; políticas; ações; planos] para atacar os problemas da: [violência; drogas; iluminação; insegurança; escolas; mulheres], que ocorrem nas: [regiões; áreas, cidade; urbano; metropolitano].
Propõem fazer isso utilizando as estratégias de: [integração; prevenção; sistemas; parcerias; formação] e utilizando como órgãos a [guarda; polícias; governos; município; federal; conselhos; agentes].

Embora o significado dos termos nem sempre seja unívoco e apareçam fora de seu contexto, as palavras em destaque já permitem identificar os grandes temas tratados nos programas de segurança dos candidatos e a nuvem de palavras nos auxilia a classificar as propostas em 13 grandes grupos.
A tabela abaixo traz a quantidade de propostas por grupo e candidato.

Rótulos de Linha
Doria
Erundina
Haddad
Olimpio
Marta
Russomano
Young
Total Geral
gestão operacional da Guarda
2


5
4
1
1
13
drogas: prevenção e recuperação
2

1
2
1

5
11
integração com outros entes
2
1

2
3
1
1
10
formação da Guarda
1
4
1



2
8
parcerias com a sociedade civil



2
1
3
1
7
informação, dados e pesquisas


1
1
1
1
2
6
tecnologia: monitoramento, radares, etc.
1

1
1
1
1
1
6
proteção a vítima, vulneráveis e minorias

1
2

1
1

5
princípios gerais


2


2
1
5
programa de prevenção nas escolas


1
1
1

1
4
iluminação
1

1
1
1


4
programas preventivos: cultura, esporte, lazer, etc.


2



1
3
engenharia institucional




1

1
2
reforma urbana
1






1
Total Geral
10
6
12
15
15
10
17
85

As medidas mais frequentes dizem respeito a mudanças na gestão e operação cotidiana da Guarda Municipal, com 13 sugestões. As orientações são as mais variadas: uns querem a guarda adotando “tolerância zero” e outros “policiamento orientado a problemas”. Entram neste rol as ideais de elaborar procedimentos operacionais padrão para a GM, como na PM, a ampliação da Operação Delegada, que emprega PMs ou GCMs nos períodos de folga, o aumento e redistribuição dos efetivos, descentralização do planejamento e outras.

A Guarda municipal é percebida pelos candidatos como o principal instrumento de atuação da prefeitura na segurança e além das mudanças na gestão existem várias propostas na esfera da capacitação e formação dos guardas. A capacitação técnica está praticamente ausente nas propostas, mas frequentemente aqui vemos a preocupação com o tratamento dado as minorias ou grupos vulneráveis: LGBT, deficientes, negros, índios, mulheres, etc. Os Guardas deveriam ser também propagadores de uma cultura da paz. As medidas parecem ser inspiradas num programa estadual, onde o operador de segurança é intrinsecamente visto como preconceituoso e violador de direitos, que precisa ser sensibilizado para estas questões... apenas uma proposta faz menção à capacitação lidar com o problema do comércio ambulante. São raros os casos de violações de direitos pela Guarda e as propostas de capacitação parecem errar no foco.

As drogas e o tratamento dos dependentes são também alvo de preocupação constante nos programas dos candidatos: o divisor de águas está entre os que apoiam e os que criticam o atual programa “De Braços Abertos” da gestão atual. As soluções apresentadas passam pela redução de danos, parcerias com os governos Federal e Estadual, ações esportivas e culturais, revitalização das áreas de uso de drogas, contratação de mais profissionais, internação em comunidades terapêuticas, convênios com grupos de apoio, grupos de autoajuda, aluguel subsidiado pela prefeitura, cursos técnicos de formação profissional, etc. Não existe cracolândia, pelo visto, no mapa da cidade dos candidatos.

A integração com outros órgãos, especialmente de segurança, está também bastante presente nos programas, o que faz sentido se pensarmos que o papel das Guardas na segurança pública é subsidiário e complementar. As sugestões visam integrar informações de inteligência e criminais entre a GCM e a PM, PC e Polícia Federal. Os diferentes órgãos do sistema planejariam em conjunto o emprego de efetivos, viaturas e outros recursos. As centrais de monitoramento e despacho seriam também integradas e a GCM firmaria parcerias com a CPtran, Ministério Público, OAB, Conselhos de Direitos. Além da integração com outros órgãos públicos, as parcerias com a sociedade civil também estão em alta entre os candidatos: parcerias com associações comerciais e de moradores, conselhos comunitários de segurança pública, empresas locais, etc. As parcerias com a sociedade serviriam para formular políticas, acompanhar e avaliar a sua implementação. A participação da sociedade dá um ar de democracia e de politicamente correto às propostas, que pouco detalham como esta parceria ocorreria na prática.

Muitos candidatos têm destacado a necessidade de trabalhar o tema da segurança a partir de dados, estatísticas, mapas e pesquisas, prática já adotada pelas polícias com algum sucesso. Tais informações serviriam para planejar melhor a atuação da GCM segundo dias, horários e locais mais problemáticos. O fortalecimento do Observatório da Segurança, a criação de um sistema municipal de inteligência urbana, a condução de pesquisas com a população e de diagnósticos com auxílio das Universidades estão dentro desta categoria de propostas, assim como a disponibilização as bases municipais para outros órgãos. Sintomaticamente, nenhum candidato menciona especificamente a utilização do 156 da própria prefeitura, do Infocrim, Infoseg ou do Copon-on line, as pesquisas de vitimização e outras de uso tradicional na segurança.  Pouca referência explícita também ao georeferenciamento ou a hot spots, bases do planejamento operacional. De todo modo, assim como no caso da integração e da participação da sociedade, a linha de pensamento é promissora. Estatísticas e mapas  permitem cobrar desempenho e atribuir responsabilidades territoriais.

Em igualdade numérica com as estatísticas e pesquisas estão as propostas que advogam a intensificação do uso de soluções tecnológicas para melhorar a segurança. Entram nesta linha de raciocínio o aumento das câmeras de segurança e sua integração com as polícias ou com o setor privado, integração com o Detecta do governo estadual, outros tipos de monitoramento eletrônico, os sistemas de alerta, os sistemas de recebimento de denúncias, etc. O uso de radares é mencionado, mas com a condição de corrigir as distorções atuais. Nenhuma menção a Big Data ou a “internet das coisas”. Nem a leitores óticos de placas, R.F.I.D, controle de acesso ou identificação biométrica. Nem ao monitoramento e uso das redes sociais para a segurança. Nada de ferramentas de B.I., “predictive policing” ou drones. Tecnologia para segurança para os candidatos parece se resumir a vídeo-monitoramento. Neste aspecto, as propostas são um tanto ultrapassadas e pouco inovadoras.

A preocupação com as minorias e os grupos vulneráveis ficou evidenciada quando analisamos as propostas de capacitação da Guarda. O tema aparece também em outras propostas, onde a prefeitura, através da Secretaria de Segurança Urbana e outras, cuidaria também do atendimento às mulheres vítimas de violência doméstica, do enfrentamento à cultura da violência, criação de programas preventivos para jovens, população em situação de rua, população LGBT, etc. Propostas de redução de fatores de risco, como gravidez na adolescência, uso de álcool e drogas, também são mencionadas de passagem. Chama a atenção a ausência das armas de fogo nos discursos. De resto, uma boa agenda conjunta com a Secretaria de Bem Estar e / ou da Saúde.

Segurança nas escolas é um dos programas prioritários da GCM e para reforçar esta segurança sugere-se o uso de novas tecnologias ou planos locais de redução da violência. As escolas aparecem ainda como lugar para formação e conscientização dos jovens, parentes e da comunidade do entorno, através de palestras, cursos e psicodramas. Iluminação pública foi lembrada pelos candidatos, vista como fator inibidor da criminalidade: ampliar a quantidade, especialmente nas regiões menos favorecidas, trocar as lâmpadas atuais por LED e rebaixar a altura das luminárias estão entre as soluções sugeridas.

Finalmente, vemos algumas poucas propostas na esfera da prevenção primária, através do aumento de opções de esportes, cultura e lazer nas regiões periféricas, especialmente voltados para os jovens.  Este tipo de proposta genérica costumava ser bastante popular nas campanhas passadas e parece vir perdendo lugar para propostas mais concretas de curto e médio prazo.

No âmbito da engenharia institucional encontramos uma proposta de reorganização institucional da Guarda e outra de criação de núcleos de segurança nas coprefeituras, ambas pouco desenvolvidas nos textos. Somente um dos candidatos articula segurança pública com um programa de reforma urbana na região central, recuperando áreas degradadas, embora este tipo de ação tenha sido relevante em experiências mundiais e conte com apoio e financiamento de organismos financeiros internacionais.
Algumas ausências são significativas e positivas neste debate: não se fala muito na compra de viaturas, armas e equipamentos. São necessários, porém, óbvios. Nem no uso da Guarda para “combater o crime” ou “perseguir a bandidagem” ao estilo Rota na Rua.

Por outro lado, algumas ausências são negativas: não existem metas específicas nos programas, talvez porque tivessem que ser entregues ao TSE antecipadamente. Nenhuma menção a orçamento ou de onde viriam os recursos para os projetos. A regulamentação dos espaços semi-públicos,  bastante usada como estratégia de segurança, foi negligenciada nos programas, assim como o uso do CPTED (prevenção através do design ambiental). Policiamento comunitário parece ter saído de moda entre os formuladores de programas de segurança, assim como o tema das “janelas quebradas” e da associação entre degradação física e social com criminalidade, tão em voga na época das consultorias milionárias pagas aos especialistas americanos. Poucas referências a problemas cotidianos da população – poluição sonora, poluição visual, pichações, flanelinhas, cambistas, sujeira, mobiliário urbano danificado, ausência de poda e jardinagem, etc. – que poderiam ser alvo de atuação da Secretaria Municipal de Segurança Urbana. A própria Secretaria é pouco mencionada nos programas.
No geral, o conjunto de propostas aborda temas relevantes e são “corretas”, embora pouco criativas. Nenhuma revolução à vista. Mas, se bem conduzidas, poderiam melhorar a qualidade de vida do paulistano. Se sairão do papel, já é outra estória.





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