terça-feira, 10 de setembro de 2024

Estamos preparados para enfrentar os eventos climáticos extremos?

 

Os eventos climáticos extremos no Brasil estão se agravando, em linha com as tendências globais de mudanças climáticas. Vários fatores contribuem para essa intensificação, incluindo o aumento da temperatura média global, a variabilidade climática e a degradação ambiental, como o desmatamento da Amazônia.

Dados do Instituto Nacional de Meteorologia (INMET) indicam que as temperaturas médias no Brasil têm aumentado gradualmente ao longo das últimas décadas. O aumento da temperatura contribui para a intensificação de fenômenos como ondas de calor e secas severas. Fenômenos cíclicos como El Niño e La Niña têm sido exacerbados pelas mudanças climáticas. O El Niño, por exemplo, tende a agravar as secas no Nordeste e aumentar o risco de incêndios na Amazônia, enquanto o La Niña pode intensificar as chuvas no Sul e Sudeste.

Segundo levantamento do Instituto Nacional de Meteorologia (Inmet), dos 12 meses do ano de 2023, nove tiveram médias mensais de temperatura acima da média histórica (1991/2020), com destaque para setembro, que apresentou maior desvio (diferença entre o valor registrado e a média histórica) desde 1961, com 1,6ºC acima da climatologia de 1991/2020https://portal.inmet.gov.br/noticias/ano-de-2023-%C3%A9-o-mais-quente-da-hist%C3%B3ria-do-brasil#:~:text=Fonte%3A%20Inmet.&text=De%20acordo%20com%20a%20vers%C3%A3o,at%C3%A9%20outubro%20do%20ano%20passado.

É possível conjecturar que o aumento da frequência e intensidade de eventos climáticos extremos explique em parte o aumento dos atendimentos dos bombeiros nos últimos anos, indicador que passou a ser monitorado pelo SINESP /MJ. Nos gráficos abaixo vemos as séries temporais de registros de combate a incêndio e de busca e salvamentos realizados pelos bombeiros entre 2015 e 2024, tomando o período de janeiro a julho de cada ano. A melhora dos registros e da notificação pode afetar estes indicadores e seria preciso detalhar as informações para verificar se de fato estes registros estão ligados aos fenômenos das secas e inundações mais frequentes.

 De toda forma, de acordo com os dados do Sinesp, os registros de incêndio teriam aumentado 157% no período. As maiores concentrações estão nos Estados de São Paulo, Rio de Janeiro e Minas, o que sugere que os dados refletem em parte o nível de organização das corporações estaduais voltadas para o fenômeno.

As buscas e salvamentos, por sua vez, cresceram 68,7% no período, novamente com concentrações no Rio, São Paulo e Minas. Mais uma vez, a incidência sugere que os registros estão antes ligados às atribuições que os bombeiros exercem em cada Estado e sua capacidade de atuação, talvez mais do que à incidência dos fenômenos relacionados às secas e inundações.

Como quer que seja, o crescimento dos registros de incêndios e salvamentos – estando ou não relacionado à intensificação dos eventos climáticos – aponta para a necessidade de repensar a estrutura dos corpos de bombeiros estaduais e dos órgãos de defesa civil, que deverão ser cada vez mais exigidos. Pelo que vimos pela distribuição dos registros do Sinesp, muitos bombeiros enfrentam escassez de recursos humanos, financeiros e tecnológicos, o que limita sua capacidade de atuação, especialmente em estados com menor arrecadação fiscal. Os órgãos de Defesa Civil padecem frequentemente dos mesmos problemas.

As secas prejudicam a produção agrícola e a segurança hídrica, enquanto inundações causam prejuízos a infraestrutura urbana e deslocam milhares de pessoas. Além disso, esses eventos têm custos significativos para a economia, com perdas agrícolas, destruição de infraestrutura e aumento dos gastos públicos para mitigação e recuperação. Os bombeiros e Defesas Civis estaduais estão preparados e dimensionados para enfrentar estes novos desafios?

Estes órgãos estão voltados primordialmente para a pós-crise, a coordenação de ações de respostas, enquanto a sociedade precisará cada vez mais de políticas públicas de mitigação, adaptação e conservação  para enfrentar esses desafios.

As Defesas Civis estaduais no Brasil são responsáveis pela coordenação, planejamento e execução de ações voltadas à proteção da população e à minimização dos danos causados por desastres naturais ou tecnológicos. Elas operam dentro do Sistema Nacional de Proteção e Defesa Civil (SINPDEC), que organiza e articula os órgãos de defesa civil em todos os níveis de governo – municipal, estadual e federal – e também entre a sociedade civil e o setor privado.

O problema que as Defesas Civis estaduais são frequentemente parte das Secretarias de Segurança Pública ou de outras pastas relacionadas à gestão de emergências, variando de estado para estado. Elas estão por vezes, subordinadas ao Gabinete do Governador, a Casa Militar ou a secretarias específicas, mas raramente são secretarias independentes, com recursos e pessoal próprios. Frequentemente são geridas por Policiais Militares ou Bombeiros, especializados, por formação, nas tarefas de resposta aos desastres.

Todavia, uma das funções primordiais das Defesas Civis estaduais é a prevenção de desastres. Isso envolve, entre outras atividades, a criação de mapeamentos de áreas de risco, monitoramento de fenômenos meteorológicos (em parceria com o INMET e outras instituições) e a promoção de políticas públicas voltadas à redução de riscos, como obras de infraestrutura (barragens, diques, drenagem) e o reassentamento de populações em áreas vulneráveis. Elas têm tarefas importantes no âmbito da coordenação dos órgãos municipais e da coleta e análise de dados.

Ao que me parece, frente aos desafios atuais e futuros, tanto bombeiros quanto os órgão de Defesa Civil estão subdimensionados e mal concebidos para lidar com o agravamento da situação climática e dos desastres naturais e humanos. Talvez seja o momento de repensar o SIMPDEC, elevar o status hierárquico das Defesas Civis dentro das estruturas dos governos, providenciar orçamentos próprios e robustos para o desenvolvimento de suas atividades, escolher gestores e equipe voltados não apenas à resposta às crises, mas principalmente à prevenção.

Alguém já observou que a guerra é importante demais para ser deixada apenas nas mãos dos militares. Os eventos climáticos e suas consequências devem afetar a sociedade e a economia, num futuro não tão remoto, em proporções maiores que muitas guerras. Estamos falando num fenômeno muito mais abrangente do que uma crise de segurança pública. Assim, sua atuação deve ser pensada antes da perspectiva estratégica do que operacional. É preciso readequar a estrutura e as políticas para enfrentar a questão, em todos os níveis de governo.

Obs: este artigo foi parcialmente escrito com o auxílio de I.A.

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