sexta-feira, 20 de março de 2020

Coronavirus e segurança pública




Uma pandemia muda hábitos de milhões de pessoas, em escalas raramente vistas.  Mexe com a economia, medos, deslocamentos, exposição.  Como não poderia deixar de ser, produz impactos em diversas áreas, entre elas a da segurança.

Alguns efeitos já são visíveis, como as tentativas de fuga e rebelião nos presídios, uma vez que o medo de contágio é grande e o risco é real, dada as condições de vida nos estabelecimentos penais.  Embora a idade média da população prisional seja menor do que a da população em geral e bem menor do que a do grupo de risco, o contágio é inevitável e as condições de tratamento quase inexistentes, nos casos graves.  Visitas devem ser interrompidas para benefício dos presos, mas a medida gera insatisfação. Alternativas, no caso de epidemia generalizada,  são a soltura dos condenados a crimes sem gravidade e evitar ao máximo novos encarceramentos, tanto no sistema adulto quanto juvenil. Lembre-se também que os agentes penitenciários estarão altamente expostos no caso de uma epidemia, de modo que é preciso limitar ao máximo os riscos dentro do sistema prisional.

Policiais, por sua vez, estarão mais expostos a contaminação, uma vez que se trata de função essencial e que não pode ser exercida de casa. Eles continuarão nas ruas e talvez tenham que usar a força para prender indivíduos infectados que não querem se submeter à quarentena, internação, tratamentos médicos, etc., lojistas recalcitrantes, vendedores de produtos milagrosos contra o vírus e outros tipos que tem problemas em seguir as novas regras ou querem tirar vantagens da situação. No limite, atuar contra rebeliões e saques. Lembre-se que o código penal conta com dispositivos que se aplicam as epidemias. O artigo 267 do CP penaliza quem “causar epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos, como pena de reclusão, de dez a quinze anos enquanto o artigo 268 pune quem “Infringir determinação do poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença contagiosa com pena de detenção, de um mês a um ano, e multa”. É preciso portanto pensar em medidas protetivas, como o uso de EPIs, licenças para os grupos de risco, etc. para proteger os trabalhadores dos serviços essenciais.

Num primeiro momento, com a diminuição do fluxo de pessoas e das oportunidades criminais, devemos presenciar a diminuição dos crimes de rua. As casas estarão também mais protegidas, com os moradores dentro de suas propriedades e os veículos nas garagens. Contrabando e tráfico devem diminuir com o fechamento das fronteiras e a diminuição do fluxo de cargas e passageiros.

Em médio e longo prazo, contudo, com os efeitos da recessão econômica, é provável que vejamos um aumento da criminalidade, caso medidas anticíclicas sejam insuficientes para deter os efeitos da crise. Existem projeções estimando  desemprego generalizado no setor de serviços, falência de milhares de empresas, para além do derretimento das bolsas, etc. Cenários pessimistas falam de uma recessão longa e intensa, com consequências inevitáveis nos níveis de criminalidade.

É provável que vejamos também mudanças na natureza dos crimes. Se caem os crimes de contato, talvez vejamos um aumento dos crimes virtuais, através de mensagens fraudulentas, por exemplo, explorando os temores da população com relação ao novo coronavirus. A venda de produtos falsos, como o álcool gel, já pode ser vista nas ruas. Outros golpes associados à epidemia devem aparecer. Do mesmo modo, a permanência da família em casa por períodos prolongados e numa situação estressante pode gerar um aumento dos conflitos domésticos.

Numa situação mais extrema de carência de produtos alimentares e de saúde, é possível que vejamos saques a estabelecimentos comerciais – especialmente farmácias e supermercados  -, embora o fenômeno não tenha sido registrado em nenhum país até agora. Não apenas porque não houve desabastecimento como porque as pessoas temem sair nas ruas e andar em grupos, o que pode ser um inibidor para os saques. Mas diria que precisamos prestar atenção a esta possibilidade, caso haja risco de desabastecimento, com o prolongamento da quarentena.

As consequências da pandemia serão muitas e variadas, algumas negativas e outras positivas, por incrível de pareça. Como topa epidemia, existe um ciclo de aceleração e desaceleração, mais cedo ou mais tarde. Vemos gente tentando se aproveitar da crise, mas também exemplos de abnegação e solidariedade. Nestas situações críticas tendemos a deixar de lado as diferenças e pensar enquanto espécie. Quem sabe depois disto tudo passemos a dar menos importância a picuinhas e frivolidades. E a valorizar coisas importantes como a família, as amizades, a ciência, a saúde e a escolha lideranças políticas competentes para lidar com situações de crise.





2 comentários:

  1. Tulio
    concordo com todos os pontos.
    Com a fechada das fronteiras, sera que teriamos mais conflitos por causa da falta de drogas no mercado? Como a polica tera que se reorganizar?

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