Uma pandemia muda hábitos de
milhões de pessoas, em escalas raramente vistas. Mexe com a economia, medos, deslocamentos,
exposição. Como não poderia deixar de
ser, produz impactos em diversas áreas, entre elas a da segurança.
Alguns efeitos já são visíveis,
como as tentativas de fuga e rebelião nos presídios, uma vez que o medo de
contágio é grande e o risco é real, dada as condições de vida nos
estabelecimentos penais. Embora
a idade média da população prisional seja menor do que a da população em geral
e bem menor do que a do grupo de risco, o contágio é inevitável e as condições
de tratamento quase inexistentes, nos casos graves. Visitas devem ser interrompidas para benefício
dos presos, mas a medida gera insatisfação. Alternativas, no caso de epidemia
generalizada, são a soltura dos
condenados a crimes sem gravidade e evitar ao máximo novos encarceramentos,
tanto no sistema adulto quanto juvenil. Lembre-se também que os agentes
penitenciários estarão altamente expostos no caso de uma epidemia, de modo que
é preciso limitar ao máximo os riscos dentro do sistema prisional.
Policiais, por sua vez, estarão
mais expostos a contaminação, uma vez que se trata de função essencial e que
não pode ser exercida de casa. Eles continuarão nas ruas e talvez tenham que
usar a força para prender indivíduos infectados que não querem se submeter à
quarentena, internação, tratamentos médicos, etc., lojistas recalcitrantes,
vendedores de produtos milagrosos contra o vírus e outros tipos que tem
problemas em seguir as novas regras ou querem tirar vantagens da situação. No
limite, atuar contra rebeliões e saques. Lembre-se que o código penal conta com
dispositivos que se aplicam as epidemias. O artigo 267 do CP penaliza quem “causar
epidemia, mediante a propagação de germes patogênicos, como pena de reclusão,
de dez a quinze anos enquanto o artigo 268 pune quem “Infringir determinação do
poder público, destinada a impedir introdução ou propagação de doença
contagiosa com pena de detenção, de um mês a um ano, e multa”. É preciso
portanto pensar em medidas protetivas, como o uso de EPIs, licenças para os
grupos de risco, etc. para proteger os trabalhadores dos serviços essenciais.
Num primeiro momento, com a
diminuição do fluxo de pessoas e das oportunidades criminais, devemos
presenciar a diminuição dos crimes de rua. As casas estarão também mais
protegidas, com os moradores dentro de suas propriedades e os veículos nas
garagens. Contrabando e tráfico devem diminuir com o fechamento das fronteiras
e a diminuição do fluxo de cargas e passageiros.
Em médio e longo prazo, contudo,
com os efeitos da recessão econômica, é provável que vejamos um aumento da
criminalidade, caso medidas anticíclicas sejam insuficientes para deter os
efeitos da crise. Existem projeções estimando desemprego generalizado no setor de serviços,
falência de milhares de empresas, para além do derretimento das bolsas, etc. Cenários
pessimistas falam de uma recessão longa e intensa, com consequências inevitáveis
nos níveis de criminalidade.
É provável que vejamos também
mudanças na natureza dos crimes. Se caem os crimes de contato, talvez vejamos um
aumento dos crimes virtuais, através de mensagens fraudulentas, por exemplo,
explorando os temores da população com relação ao novo coronavirus. A venda de
produtos falsos, como o álcool gel, já pode ser vista nas ruas. Outros golpes
associados à epidemia devem aparecer. Do mesmo modo, a permanência da família
em casa por períodos prolongados e numa situação estressante pode gerar um
aumento dos conflitos domésticos.
Numa situação mais extrema de
carência de produtos alimentares e de saúde, é possível que vejamos saques a
estabelecimentos comerciais – especialmente farmácias e supermercados -, embora o fenômeno não tenha sido registrado
em nenhum país até agora. Não apenas porque não houve desabastecimento como
porque as pessoas temem sair nas ruas e andar em grupos, o que pode ser um
inibidor para os saques. Mas diria que precisamos prestar atenção a esta
possibilidade, caso haja risco de desabastecimento, com o prolongamento da
quarentena.
As consequências da pandemia
serão muitas e variadas, algumas negativas e outras positivas, por incrível de
pareça. Como topa epidemia, existe um ciclo de aceleração e desaceleração, mais
cedo ou mais tarde. Vemos gente tentando se aproveitar da crise, mas também
exemplos de abnegação e solidariedade. Nestas situações críticas tendemos a
deixar de lado as diferenças e pensar enquanto espécie. Quem sabe depois disto
tudo passemos a dar menos importância a picuinhas e frivolidades. E a valorizar
coisas importantes como a família, as amizades, a ciência, a saúde e a escolha lideranças
políticas competentes para lidar com situações de crise.
Muito bom, Túlio Kahn!!!
ResponderExcluirTulio
ResponderExcluirconcordo com todos os pontos.
Com a fechada das fronteiras, sera que teriamos mais conflitos por causa da falta de drogas no mercado? Como a polica tera que se reorganizar?