terça-feira, 20 de junho de 2017

A(s) Crise(s) e o déficit institucional



Instituições são estruturas que regulam o comportamento de um conjunto de indivíduos numa sociedade. Elas transcendem os indivíduos, organizam suas interações e como tal cumprem um papel relevante de socialização e regulação social. Quanto maior a confiança nas instituições, maior o respeito às regras e normas delas emanadas: leis, decisões judiciais, preceitos morais, políticas governamentais, etc.

Um dos efeitos mais graves das crises - política, social, moral, econômica – que o país vivencia nos últimos anos é a perda de confiança nas instituições. É muito mais do que uma avaliação ruim dos últimos governos e governantes, algo que pode bem ou mal ser resolvido com novas eleições, melhora da economia, aperfeiçoamento de políticas contra a corrupção ou com rearranjos legalmente previstos para a alteração dos mandatários. É um mal-estar mais profundo, mais generalizado, com implicações igualmente mais sérias. Pois há uma perda de confianças nos mecanismos mesmos que seriam responsáveis pela superação das outras crises.

Vivemos uma crise institucional? Não chegamos a este patamar venezuelano: bem ou mal a economia reage, a lava-rápido avança, o congresso aprova reformas importantes, as mudanças ocorrem dentro dos marcos institucionais, o judiciário julga e suas decisões são respeitadas, a imprensa trabalha livremente, os partidos políticos participam da gestão e da formulação da reforma partidária, trabalhista, previdenciária e outras leis de interesse público.
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Mas as instituições saíram abaladas, como não poderia deixar de ser. Desde 2009 o Ibope publica um Índice de Confiança Social, medindo a confiança da população em algumas instituições.  O índice médio de confiança nas instituições caiu 14,5% de 2009 para 2017, passando de 57,6 para 49,3.










O tombo é maior quando analisamos algumas categorias em especial: queda de 48,6% na confiança no Congresso Nacional, de 45,2% na confiança dos partidos políticos e de 78,8% no presidente da república. O quadro é ainda mais complexo quando se vê que os níveis de confiança em algumas instituições já eram bastante baixos em 2009 e ficaram ainda piores em 2017. Congresso Nacional e Partidos Políticos gozavam da confiança de apenas 1/3 da população em 2009 e a fração reduziu-se a menos de 1/5. Os escândalos de corrupção atingiram particularmente a classe política, uma vez que que alguns de seus membros foram os principais beneficiários dela, embora não os únicos. (As Forças Armadas, em compensação, embora afetadas, continuam a gozar de amplo prestígio e se recuperaram com relação a 2013...)

Note-se que no auge das manifestações de 2013, no período pré-impeachment, a confiança nas instituições chegou ao seu limite mais baixo (46,7). Mas de 2013 para cá, como se vê na última coluna em verde, algumas instituições recuperaram seu prestígio enquanto outras continuaram se deteriorando: todas elas, não por acaso, ligadas ao sistema político (governo local, eleições, governo federal, congresso, partidos, presidência).

A pior consequência do descalabro dos últimos governos não foi a falência administrativa e financeira do país, cuja recuperação é factível e moderadamente rápida, tomadas as medidas necessárias. Muito pior foi a crise moral deixada, a descrença generalizada na política, na democracia, nas eleições, nos políticos e nas instituições em geral. O ceticismo. A desesperança. O alheamento. A vontade de sair do país e mudar para outro lugar. A desconfiança de tudo e em todos.

Na ausência de canais legítimos, política agora se faz pelas mídias sociais, no ministério público, no judiciário. Partidos, sindicatos, parlamentos e eleições são démodê. Participar da administração pública, militar em partidos e concorrer a cargos públicos é coisa para a gentalha sem escrúpulos - como se o setor privado estivesse imune ao problema da corrupção... A crise, em suma, apagou a “vocação para a política”, ou ao menos para a política institucionalizada.

A recuperação da credibilidade das instituições é lenta, difícil e não vingará sem uma mudança profunda nas regras do jogo. Mas mudança que terá que ser feita ela mesma dentro das regras do jogo: não existe sociedade democrática sem a existência de partidos políticos, deputados, senadores, eleições livres e periódicas, liberdade de imprensa, respeito à Constituição e ao Estado de Direito. Não há saída pela manu militari, pelo judiciário, pelo facebook ou twitter. Nem mesmo pelo merecidamente prestigiado corpo de bombeiros. No dia em que nos esquecermos disso, é porque as instituições já foram mesmo para o buraco. Neste caso, nem os bombeiros nos tirarão de lá!


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